NOV/DEZ 2021 – Edição 238 Ano 34 - VER EDIÇÃO COMPLETA

A seletividade do ICMS para energia elétrica e serviços de telecomunicação

7 de dezembro de 2021 | por Luiz Gustavo Bichara, Murillo Allevato e Bruno Matos Ventura | Fotos: Divulgação
Bruno Matos Ventura - Seletividade do ICMS - Revista Shopping Centers
Bruno Matos Ventura

O artigo 155, § 2º, inciso III, da Constituição Federal de 1988 (“CF/88”) atribuiu ao ICMS a aplicação do Princípio da Seletividade, pelo qual as respectivas alíquotas são estabelecidas de forma menos gravosa com relação às mercadorias e serviços de caráter essencial, reservando a tributação majorada àquelas menos relevantes ou até supérfluas.

A CF/88, ao reservar a cada Estado a escolha quanto à aplicação do critério da seletividade e condicionar sua adoção diretamente à “essencialidade das mercadorias e dos serviços”, procurou evitar, em manifesta conduta extrafiscal com interesse arrecadatório, que a eleição das respectivas alíquotas de ICMS ocorresse de forma desregrada ou injusta.

Ademais, a própria legislação brasileira reconhece que a energia elétrica e os serviços de telecomunicação são bens e serviços essenciais, conforme dispõe o artigo 10, incisos I e VII da Lei nº 7.783/89, o que afastaria quaisquer dúvidas neste sentido.

Não obstante isso, os Estados e o Distrito Federal estabeleceram alíquotas majoradas para o fornecimento de tais itens, cujas aquisições se fazem extremamente necessárias, tanto para toda a população quanto para a integralidade dos setores produtivos e profissionais, o que demonstra claramente o puro objetivo de incrementar a arrecadação.

Luiz Gustavo Bichara - Seletividade do ICMS - Revista Shopping Centers
Luiz Gustavo Bichara

Com efeito, as Autoridades Fiscais defendiam que a CF/88 estabelecia a possibilidade, mas não a obrigatoriedade de adotar o princípio da seletividade. Portanto, considerando que a fixação das alíquotas do citado imposto estadual é de competência exclusiva dos entes federativos, a fixação dependeria exclusivamente da política fiscal adotada por cada um. 

Diante desta controvérsia, diversos contribuintes ingressaram com medidas judiciais objetivando o reconhecimento do direito de recolher o ICMS sobre o fornecimento de energia elétrica e serviços de telecomunicação com base nas alíquotas gerais praticadas pelos Estados e Distrito Federal (geralmente 18%), bem como a restituição dos valores recolhidos a maior nos últimos cinco anos. 

Murillo Allevato - Seletividade do ICMS - Revista Shopping Centers
Murillo Allevato

Após longo debate nos tribunais, a controvérsia alcançou o Supremo Tribunal Federal –STF-, que submeteu a matéria à sistemática da Repercussão Geral (Recurso Extraordinário nº 714.139 – Tema 745). A referida sistemática é aplicada toda vez que o referido tribunal reconhece a existência de questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo, que são discutidas em diversos recursos sobre o mesmo tema.

O STF, por maioria, reconheceu a inconstitucionalidade na fixação de alíquota nas operações com energia elétrica e serviços de telecomunicação em patamar superior à alíquota geral. No referido julgamento, os Ministros Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Roberto Barroso, que foram vencidos, divergiram deste entendimento, sob o argumento de que a inconstitucionalidade deveria ser reconhecida apenas com relação aos serviços de telecomunicação. 

No entanto, cumpre mencionar que o Ministro Dias Toffoli propôs a modulação da eficácia da decisão para que “ela produza efeitos a partir do início do próximo exercício financeiro, ressalvando as ações ajuizadas até a véspera da publicação da ata do julgamento do mérito”, a qual foi publicada em 29.11.2021. 

Desta forma, caso seja aprovada a proposta de modulação de efeitos da decisão do STF, nos termos mencionados acima, apenas os contribuintes que ajuizaram medidas judiciais antes da publicação da ata poderão restituir os valores recolhidos a maior nos últimos cinco anos. 

Com relação aos contribuintes que ainda não possuem medida judicial, estes deverão propor imediatamente uma ação para poderem aplicar a alíquota geral sobre esses itens, haja vista que a decisão do STF apenas vincula os tribunais e não as Autoridades Administrativas, que provavelmente manterão a cobrança com base nas alíquotas atuais. 

Luiz Gustavo Bichara é sócio-fundador do Bichara Advogados, com mais de 25 anos de experiência em assessoria jurídica na área Tributária. É Conselheiro Federal da OAB e Procurador Especial Tributário do Conselho Federal da OAB.

Murillo Allevato é sócio da área Tributária do Bichara Advogados. É pós-graduado em direito tributário pela FGV e possui mestrado em direito tributário internacional pela Universidade de Viena.

Bruno Matos Ventura é associado sênior da área Tributária do Bichara Advogados. É pós-graduado em direito tributário pela FGV e possui mestrado em direito tributário internacional pela Universidade de Georgetown.

*A opinião dos autores não reflete, necessariamente, a opinião da Abrasce.

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