MAR/ABR 2024 - Edição 252 Ano 37 - VER EDIÇÃO COMPLETA

Desafios e debates em torno da igualdade salarial e da Legislação Trabalhista

28 de março de 2024 | por Simone Matile

Nos últimos tempos, o cenário jurídico e empresarial brasileiro tem sido marcado por discussões intensas relacionadas à igualdade salarial e à legislação trabalhista. Apesar dos avanços significativos na participação e ocupação feminina no mercado de trabalho nas últimas décadas, ainda persiste uma grande discrepância salarial entre homens e mulheres.

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Simone Matile é sócia do escritório Martins Castro Monteiro Advogados – MCMA, graduada pela Faculdade de Direito FMU, pós-graduada pela FGV em Direito Empresarial e pelo Insper em Shopping Center Management Program

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as mulheres recebem, em média, salários 22% menores em comparação aos homens. A disparidade se acentua ainda mais em cargos de liderança, onde as mulheres podem receber até 34% menos do que homens ocupando a mesma posição.

Em resposta a essa desigualdade persistente, foi promulgada a Lei 14.611 em 03 de julho de 2023, reforçando a obrigação de igualdade salarial entre homens e mulheres. A Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) já previa essa obrigatoriedade de equiparação, mas a Lei 14.611 trouxe novidades importantes, como a implementação de mecanismos de transparência salarial e o aumento da fiscalização para evitar discriminação.

Entretanto, como a Lei 14.611 previu a necessidade de regulamentação das regras nela previstas de forma genérica, em 23 de novembro de 2023, foi publicado o Decreto 11.795 estabelecendo medidas para garantir a equiparação salarial e proibir a discriminação de gênero nos processos de seleção e promoção. Além disso, empresas com mais de 100 funcionários devem publicar relatórios semestrais sobre salários e critérios de remuneração, respeitando os princípios da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).

A partir destes relatórios, se constatada a desigualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens pelo Ministério do Trabalho e Emprego, os empregadores serão notificados para que elaborem, no prazo de noventa dias, o Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens. Determinou-se, ainda, que as denúncias relacionadas à discriminação salarial e de critérios remuneratórios serão apresentadas, preferencialmente, em canal específico a ser disponibilizado.

Em caso de descumprimento das medidas indicadas, o Ministério do Trabalho e Emprego poderá aplicar multa administrativa em valor correspondente a até 3% da folha de salários da empresa, limitado a cem salários-mínimos, sem prejuízo das sanções aplicáveis aos casos de discriminação salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens.

Apesar das medidas promissoras, surgiram debates sobre os desafios jurídicos enfrentados pelas empresas para comprovar a igualdade salarial, especialmente em questões subjetivas envolvendo experiência e produtividade, aumentando os riscos de litígios trabalhistas. A recente Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7612, ajuizada pela Confederação da Indústria e pela Confederação Nacional do Comércio, Bens, Serviços e Turismo, questiona pontos da legislação que necessitam de adequações, como desigualdades legítimas em decorrência do tempo na função e na empresa, ressaltando-se que a divulgação dos relatórios de transparência salarial poderão colocar em risco a imagem e a reputação das empresas, uma vez que neles existirão diferenças de remuneração legitimadas e se não houver uma explicação sobre esta diferença darão ensejo à falsa conclusão de que a empresa está agindo de forma irregular em relação à isonomia salarial.

A decisão do Supremo Tribunal Federal sobre a ADI 7612 será um marco na jurisprudência sobre direitos trabalhistas e igualdade de gênero no Brasil, não apenas definindo a aplicabilidade da Lei 14.611/2023, mas também influenciando futuras legislações e políticas públicas voltadas à promoção da igualdade no ambiente de trabalho. 

Para as empresas do setor de shopping centers, é fundamental que também estejam comprometidas com a promoção da igualdade de gênero e implementem medidas concretas para garantir um ambiente de trabalho justo e inclusivo para todos os seus funcionários. Isso não apenas fortalece a conformidade legal, mas também contribui para a construção de uma cultura organizacional que valoriza a diversidade e o respeito mútuo.

Assim, as administradoras e proprietárias de shopping centers devem observar e atender às regras descritas na legislação para garantir a igualdade salarial entre homens e mulheres em seus estabelecimentos. Para cumprir as disposições da Lei 14611/2023 e do Decreto 11.795/2023, é essencial implementem políticas claras de transparência salarial e adotem medidas eficazes para evitar a discriminação de gênero nos processos de seleção e promoção.

E, considerando que a ADI 7612 levanta questões relevantes sobre a adequação e interpretação da legislação trabalhista em relação às desigualdades legítimas existentes no ambiente de trabalho, as administradoras e proprietárias de shopping centers devem acompanhar de perto o desenrolar desse processo judicial e estar preparadas para ajustar suas políticas e procedimentos, conforme o necessário.

Em suma, os debates em torno da igualdade salarial e da legislação trabalhista refletem a necessidade contínua de aprimoramento das leis e práticas empresariais, visando garantir um ambiente de trabalho mais justo e igualitário para todos. As empresas brasileiras, incluindo as administradoras e proprietárias de shopping centers, têm um papel importante na promoção da igualdade salarial e no cumprimento da legislação trabalhista, na medida em que, ao adotarem políticas transparentes e permaneceram atentas às mudanças na legislação e jurisprudência, podem contribuir significativamente para o aprimoramento das práticas empresariais inclusivas.

A opinião dos autores não reflete, necessariamente, a opinião da Abrasce.

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