JUL/AGO 2021 – Edição 236 Ano 34 - VER EDIÇÃO COMPLETA

Sempre à frente do seu tempo

10 de agosto de 2021 | por Solange Bassaneze | Fotos: Divulgação
Abrasce celebra história de quase cinco décadas que acompanha a evolução dos shopping centers no Brasil e vem sendo construída sempre em defesa do setor e na proteção dos interesses dos associados

A Abrasce completa 45 anos em setembro e, ao longo do tempo, tem se consolidado como uma das mais importantes entidades de classe do país, com representatividade nas cinco regiões, ocupando um espaço muito importante junto ao poder público e à sociedade. Sua história vem sendo construída a muitas mãos e teve início quando o negócio de shopping centers era algo ainda novo no país e se inspirava nos modelos americanos, que surgiram após a Segunda Guerra Mundial e se espalharam mundo afora. 

Em 1976, ano em que foi fundada, ainda existiam poucos empreendimentos no Brasil e havia uma necessidade de aprender mais sobre o setor. A partir da iniciativa dos primeiros empresários que investiram nesse mercado no Brasil, como Carlos Jereissati, Donald Stewart, Sergio Andrade de Carvalho, Newton Rique, Eugênio Agostini Netto, entre outros pioneiros, nascia a entidade.

Segundo Glauco Humai, presidente da Abrasce, a trajetória da associação é marcada por uma evolução constante, com diversas atividades sendo incorporadas à atuação no país, o que reforça seu amadurecimento contínuo. “Ela chega aos 45 anos na sua melhor forma desde a fundação. Acredito que o maior desafio da história foi o momento em que todos os shoppings foram fechados em decorrência da pandemia. A entidade foi muito demandada e cobrada, mas soube dar respostas aos seus associados e à cadeia produtiva. Conseguiu crescer em termos de amplitude, reconhecimento e avaliação positiva”, explica.

Glauco Humai 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers
Glauco Humai, presidente da Abrasce

Ao longo de todos esses anos, a política e a economia sempre tiveram impacto direto no setor. Durante a ditadura, mesmo com o chamado “milagre econômico” (1968-1973), movimento que, apesar de trazer a abertura da economia brasileira, reforçou a desigualdade social e aumentou a concentração de renda, podia-se contar nos dedos de uma mão o número de shoppings no Brasil.

Mesmo com a recessão seguinte e os anos 1980 conhecidos como a “década perdida” por conta da estagnação econômica, o número de empreendimentos seguiu em alta até o início dos anos 1990 – período também marcado pelo mandato do primeiro presidente eleito pelo voto direto após o regime militar. A estabilidade econômica adquirida com o Plano Real, criado em 1994 como um controle da maior crise inflacionária da história, fez que houvesse muitos investimentos no setor e, então, já contávamos quase 300 shoppings espalhados pelo País. Essa crescente foi até o começo dos anos 2000, assim como foi o crescimento e o fortalecimento da Abrasce.

Sérgio Carvalho 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers

Um dos fundadores da associação e também da Ancar (atual Ancar Ivanhoe), Sergio Carvalho lembra desses e de outros momentos desafiadores para o mercado e para a entidade: os diversos planos econômicos com troca de moedas, os índices de correção dos aluguéis e até as diversas tentativas de criação de leis para a regular a relação individual entre os lojistas e os empreendedores. Para Carvalho, em todos eles, a associação teve um papel essencial de representação e defesa do setor. “A participação da Abrasce liderando discussões foi fundamental para chegarmos ao nível de pujança e sofisticação que o nosso setor tem hoje”, enfatiza. 

A partir de 2006, o cenário macroeconômico favorável atraiu investidores estrangeiros assim como empreendedores brasileiros. O varejo vivia a década de ouro e, consequentemente, subia o número de empreendimentos, passando de 500 shoppings. Esse movimento de novos malls, bem como as reformas, as ampliações e as modernizações dos prédios já existentes seguem até hoje, reverberando a importância do setor em sua respectivas localidades. Segundo o Censo Brasileiro de Shopping Centers da Abrasce, no ano de 2020, a ABL (Área Bruta Locável) chegou a 16,98 milhões de m2.

Desde a chegada da pandemia no país em março de 2020, a Abrasce tem sido fundamental para o enfrentamento da pior crise da história dos shoppings. José Isaac Peres, presidente da Multiplan, destaca o quanto a entidade foi importante no período em que todos os shoppings foram fechados, algo nunca vivenciado na história do setor. “A atuação da Abrasce foi relevante para garantir a segurança dos empreendimentos durante o processo de retomada das atividades, com a criação de um protocolo de segurança validado por renomadas instituições de saúde. Além disso, contribuímos também como interlocutores com o poder público e os lojistas para discussão de medidas para permitir a sobrevivência de todos os elos da grande cadeia que compõe um shopping center”, explica Peres.

Carlos Jereissati Filho Iguatemi 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers

Com certeza, o momento continua sendo desafiador e a Abrasce tem conseguido coordenar os quase 400 shoppings associados – de um total de  601 presentes em todo Brasil – para que todos tenham o mesmo alinhamento, entendimento, discurso e ações. “Temos como objetivo sempre nos manter próximos dos associados, respondendo aos anseios, mas também, em alguns momentos, liderando esse processo como tem sido agora durante a crise sanitária”, destaca Humai. 

Carlos Jereissati Filho, CEO da Iguatemi Empresa de Shopping Centers, também destaca o trabalho atual da entidade durante a pandemia, articulando e propondo diversas alternativas para a reabertura dos empreendimentos e, inclusive, conversando com várias instituições e representantes do poder público. “A associação mostrou a importância de não só atuar preventivamente e ter políticas recorrentes de contrato com todas as esferas de poder do país, mas de ser um ponto de referência para todos os associados em momentos especiais. Foi bastante importante o desempenho do Conselho Diretor, da entidade e da presidência. Tudo funcionou para que pudéssemos passar por essa crise da melhor maneira possível. Lideramos muitas iniciativas que foram seguidas por outros setores, o que demonstra o nível de organização e profissionalização da entidade hoje. É uma das associações mais operativas do país, com abrangência nacional”, afirma Jereissati Filho.  

Atuação sólida

Um dos pilares da entidade é a defesa do setor, que tem como objetivo promover o diálogo constante com os três poderes, atuando em todas as instâncias jurídicas para defender os direitos dos associados. Além de uma equipe jurídica interna, a Abrasce mantém um escritório em Brasília e possui parcerias com renomados escritórios de advocacia. 

Renato Rique Aliansce Sonae 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers

É esse papel de defesa e de proteção que, segundo Carvalho, foi e continua sendo importantíssimo. Ter os principais líderes do setor como membros da diretoria ou de algum comitê executivo contribuiu para a construção e o fortalecimento da organização. “A indústria de shopping centers brasileira é referência no mundo, tanto que alguns dos principais players mundiais investem ou já investiram no Brasil. Brookfield, Sonae Sierra, CPP IB, Sam Zell, Ivanhoe Cambridge, Cadillac Fairview, GIC são apenas alguns exemplos de investidores imobiliários internacionais que acreditaram no potencial do nosso setor e acabaram se associando a players brasileiros”, conta.

A seriedade com que os temas relacionados à indústria são tradados está na trajetória dos 45 anos da associação. Esse pilar de defesa do setor ganhou ainda mais foco e intensidade no final dos anos 2000, quando a entidade passou a acompanhar todos os projetos de lei, que afetam direta e indiretamente a indústria.

Renato Rique, presidente do Conselho de Administração da Aliansce Sonae, reforça que a Abrasce nasceu pequena, formada por empreendedores pioneiros, e desde então, já se propunha a disseminar o conhecimento do setor e a defender dos interesses da indústria. “A Abrasce é reconhecida como uma das mais representativas entidades do País. No mundo polarizado em que vivemos, é imprescindível ter uma associação forte para defender o setor, o comércio e a iniciativa privada”, ressalta. Entre tantos momentos delicados, ele destaca duas atuações da entidade: a formulação da nova lei de locações urbanas, em 1991, e o momento atual no enfrentamento à pandemia e suas inúmeras consequências.

José Isaac Peres Multiplan 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers

O trabalho contínuo desenvolvido pela entidade mostra o quanto ela está preparada para enfrentar crises, mesmo as mais inesperadas, como esse momento vivido por toda a humanidade. De acordo com Peres, o papel desempenhado pela associação fortalece e dá visibilidade à importância de um dos setores que mais gera empregos no Brasil. “Se compararmos o investimento em shopping center por milhão de reais, veremos que gera 20 vezes mais empregos que a indústria com o mesmo capital investido. O shopping center está dentro da atividade terciária e aplica mão de obra intensiva. A atuação da Abrasce junto aos principais atores do setor, bem como do comércio, da iniciativa privada em geral e do poder público, é muito relevante para que todos os envolvidos no mercado – administradoras, lojistas e prestadores de serviços – sejam bem representados por uma entidade bem estruturada, que preza pelo diálogo e pela ética no crescimento do setor no país”, destaca Peres. 

Para quem viu a entidade nascer como Paulo Stewart, empresário com mais de 36 anos de atuação nesta esfera e filho de Donald Stewart, um dos fundadores da associação, o avanço da organização é nítido. “A Abrasce começou com um movimento dos founding fathers. Desde então, teve um grande progresso institucional na representatividade junto aos seus principais stakeholders, na defesa dos interesses da indústria e no aprimoramento das relações com o legislativo. Graças a esse trabalho, felizmente, nós temos uma lei de locações que ainda nos garante um bom grau de liberdade de definições de termos e definições de contrato”, destaca Stewart.

Henrique Falzoni Enplanta 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers

Monitorar os projetos de lei nos âmbitos municipal, estadual e federal foi um passo muito importante dado pela entidade. O empresário e fundador da Enplanta, Henrique Falzoni, recorda que, em seu mandato de 1996 a 1998, já existiam muitos empreendimentos, bem como a cultura educacional da entidade de repassar os conhecimentos de como fazer um shopping. Foi quando uma nova demanda surgiu. “Começaram a aparecer diversos projetos de lei, como, por exemplo, de proibir a cobrança estacionamento ou de impedir o funcionamento dos shoppings aos domingos, que nos afetavam diretamente. Tínhamos que ir à Brasília pessoalmente para tentar explicar o quanto isso seria prejudicial à economia. Me lembro quando nos reunimos com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso para explicar que precisávamos abrir aos domingos. Hoje a entidade é vital e essencial para defender os associados”, relata. No caso da cobrança dos estacionamentos, as batalhas na justiça se estenderam para as Câmaras Legislativas dos estados e municípios e, em alguns casos, por mais de uma década. “Foram muitas vitórias conquistadas ao longo de todos esses anos, mas o trabalho precisa ser contínuo”, explica. 

A estruturação da defesa do setor foi acontecendo de forma gradativa, mas com mais intensidade a partir dos anos 2000. Jereissati Filho diz que, em seu mandato, exercido entre 2002 e 2004, a Abrasce ainda não tinha uma base forte e representativa em Brasília (DF) para atender os interesses e as necessidades do setor e foi o momento em que era necessário discutir vários assuntos ligados a modificações de projetos importantes. Na presidência de Luiz Fernando Pinto Veiga, isso se consolidou e, hoje, no mandato de Humai, é uma das áreas mais demandadas da entidade. “O maior desafio continuará sendo constantemente defender e demonstrar a importância dos shoppings para o varejo e o setor imobiliário e no desenvolvimento das cidades, além de fazer ainda com que o negócio seja entendido como algo bastante relevante no desenvolvimento econômico e social do país em todas as esferas (estadual, municipal e federal)”, enaltece o presidente da Iguatemi.

Apoio do Conselho

Os Conselhos Diretivo e Deliberativo da Abrasce são fundamentais para esse desenvolvimento constante do setor, além de imprimirem representatividade e respaldo à associação. Ambos têm os empreendedores de grandes grupos como membros e é realizado um trabalho constante e consistente. Das reuniões, saem muitas das resoluções tomadas pela associação.

Segundo o copresidente da Ancar Ivanhoe, Marcelo Carvalho, é fundamental integrar o Conselho Diretor para discutir o futuro do negócio e os desafios, buscando sempre um caminho de forma conjunta na defesa dos interesses do setor. “A Abrasce foi e continua sendo extremamente importante não só pela força, mas pela seriedade com que é conduzida pelos seus diretores executivos e pelo conselho. Ela é a associação do setor e não há questionamento disso. Isso foi fruto de um trabalho sério construído a muitas mãos e há muitos anos”, ressalta Marcelo.  

Marcelo Carvalho 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers

Atualmente, o Conselho Diretor tem como presidente Fernando Maia (Saga Malls) e como membros Carlos Jereissati Filho (Iguatemi Empresa de Shopping Centers), Eduardo Gribel (Tenco Shopping Centers), Marcos Carvalho (Ancar Ivanhoe), Renato Rique (Aliansce Sonae), Ruy Kameyama (brMalls) e Vander Aloísio Giordano (Mutiplan).

Participar do Conselho Diretor exige um grande comprometimento e todos entendem essa responsabilidade. “Costumo dizer que o dinheiro mais importante é o dinheiro difuso, de todos nós, e é nossa responsabilidade aplicar e fiscalizar bem os recursos da Abrasce para que eles sejam aplicados no melhor interesse do nosso mercado. O Conselho demonstra que precisamos conversar, nos alinhar e defender o negócio em muitos assuntos, criando caminhos comunicantes com todos stakeholders da sociedade e isso é mais legítimo quando é feito por meio da associação”, declara o CEO da Iguatemi. 

Os Conselhos também são essenciais para que a Abrasce possa contribuir cada vez com a evolução de um setor que está em constante mudança e se inovando de forma acelerada. De acordo com Peres, o shopping sempre foi um lugar de convivência, experiência e conveniência, sendo um destino para quem precisa resolver diferentes aspectos do dia a dia. “Vemos que essa é hoje uma tendência consolidada no País e, ao estarmos junto com a associação, contribuímos para expandir este conceito e fortalecer o setor. Criando tendências e acompanhando as demandas do cliente, seremos sempre parte fundamental da sua vida”, diz.

Rique, do Conselho de Administração da Aliansce Sonae, que presidiu a Abrasce quando tinha menos de 30 anos de idade, seguindo os passos de seu pai, Newton Rique, um dos fundadores da entidade, também compartilha sobre a importância do trabalho desenvolvido pelo Conselho Diretor. “Sempre estivemos presentes e ativos na sua história. Creio que esta entrega de todos os associados ajudou a fortalecer a indústria e uma indústria de shopping centers forte é fundamental para a grandeza do comércio varejista”, conta.

O presente e o futuro

Com a pandemia, nunca houve um monitoramento tão intenso do setor. Isso porque os decretos municipais e estaduais mudavam repentinamente e constantemente devido à instabilidade causada pela pandemia. Os questionamentos e dúvidas são inúmeros, mas a Abrasce segue antenada e pronta para o hoje e o para amanhã. Mas o que está por vir? 

O presidente da Abrasce acredita que a crise sanitária causada pelo Covid-19 deixará marcas que vão durar algum tempo, com mudanças estruturais grandes no setor, tanto as que convergem para a digitalização, quanto as de gestão dos equipamentos em relação à segurança e sanitização, até o entendimento da importância do shopping na sociedade. “A associação vai ter ainda que manter diálogo com o poder público e a sociedade para reiterar a relevância e a importância do shopping dentro das cidades e dos centros urbanos”, destaca Humai.

Com a aceleração da omnicanalidade, intensificada pela crise, o copresidente da Ancar Ivanhoe acredita que o desafio da entidade e da indústria passa a ser a transformação digital do setor de varejo, acelerada pela pandemia. “Está na relevância que o shopping tem para que o consumidor continue frequentando o empreendimento e a compra física seja parte de uma jornada que, hoje, é física e digital. A nossa visão do futuro é como integrar nosso negócio nesse momento da jornada da omnicanalidade”, explica Marcelo.

A capacidade de reinvenção, a resiliência e o papel que os shoppings têm na vida dos brasileiros são fatos comprovados e isso deve continuar como uma missão, com um relacionamento cada vez mais consolidado com os varejistas. “A transformação digital do varejo vai exigir uma dose de criatividade, mas estou certo que iremos encontrar o caminho, pois sempre colocamos o consumidor no centro das atenções e ele reage positivamente. Cabe registrar que nada disso seria possível se não tivéssemos alcançado uma boa reputação na relação com os lojistas. Dificilmente vemos no Brasil um lojista de sucesso que não esteja presente nos shoppings brasileiros. Isso é uma demonstração da maturidade do setor e da sua relevância para o segmento varejista”, complementa Marcelo Carvalho.

Paulo Stewart relembra o avanço do comércio eletrônico nos últimos anos e o quanto o phygital (termo utilizado para definir as jornadas física e digital do consumidor) foi acelerado pela pandemia da Covid-19. “Houve uma transformação de hábitos, em que as novas gerações têm interesses, motivações de compras e hábitos de vida diferentes. Entender essa percepção de como querem interagir com o consumo, o serviço, o entretenimento e o shopping center é de uma importância fundamental. Eu observava de seis anos para cá um momento de ruptura da indústria, o modelo que funcionou nos últimos 15 anos já está fora da mesa. É óbvio que os grandes shoppings dominantes na margem vão sofrer um pouco e vão se reinventar, mas qualquer novo empreendimento hoje tem que estar atento para questões ligadas a experiências e a novas alavancas de conteúdo”, alerta Paulo. 

Um pouco da história

Terceira geração de uma família de banqueiros, Sergio Carvalho tinha acabado de vender o banco Andrade Arnauld em 1971 quando foi convidado a ser diretor do Banco do Brasil, em Brasília (DF). Em um dos encontros na capital federal, foi apresentado ao Donald Stewart, fundador da Ecisa. Então, Carvalho se envolveu com a construção do brasiliense Conjunto Nacional e acabou se tornando sócio do empreendimento, dando origem a Ancar – hoje, Ancar Ivanhoe. Como shopping center era um modelo de negócio que estava nascendo e se expandindo fortemente nos Estados Unidos e começava a chegar ao Brasil, Carvalho e Stewart souberam da existência do ICSC (International Council of Shopping Centers) e decidiram participar de uma conferência anual que acontece até os dias de hoje em Las Vegas. 

“Voltamos absolutamente encantados, principalmente com a preocupação dos americanos para que o conceito desse certo. O lema do ICSC era mais ou menos o seguinte: se eu tenho um dólar e você tem outro dólar e trocamos, cada um continua com um dólar, mas se eu tenho uma ideia e você tem outra ideia e trocamos, ambos saímos com duas ideias”, lembra Carvalho. Com base nesse princípio, fundaram a Abrasce e Sergio Carvalho foi convidado a ser o primeiro presidente entre 1976 e 1978, tendo exercido mais dois mandatos nas décadas de 1980 e de 1990. A associação se inspirava muito nos eventos do ICSC, o que motivou a organizar o Congresso Internacional de Shopping Centers no Brasil, evento que acontece até hoje, a cada dois anos, e é o maior da América Latina. 

“Na primeira edição, convidamos os amigos do ICSC para virem nos prestigiar e o Congresso virou uma tradição. Sempre contava com a presença de alguns dos maiores players do setor do mundo que vieram nos ensinar e aprender o que estávamos fazendo”, conta Carvalho. 

Com isso, o foco em educação também tornou-se, ao longo dos 45 anos, imperativo para a associação e contribuiu muito para profissionalização do setor, com a organização de cursos e eventos como Seminário Jurídico, Exposhopping, Congresso Internacional de Shopping Centers, Seminário de Segurança e Operações, Enasuper, AbrasceLab, entre outros. 

“Isso propiciou o intercâmbio de conhecimento que ajudou a nossa indústria a ser uma das mais sólidas do mundo”, destaca Rique. Em todos os anos de história, a Abrasce teve diferentes momentos em que sua atuação fez toda a diferença para o desenvolvimento e crescimento do setor. “A criação do Prêmio Abrasce, por exemplo, foi um importante marco para reconhecer as melhores práticas e iniciativas adotadas pelos shoppings no País”, elucida Peres. 

Para todos os executivos, os eventos da Abrasce sempre foram conceituados e relevantes e, com isso, a cada edição se torna ainda mais desafiador trazer novidades e manter o setor aquecido. “No entanto, isso é algo que nos motiva, porque a inovação está em nosso DNA”, enaltece Humai. 

A troca de experiências entre a Abrasce e o ICSC permitiu que Sérgio Carvalho pudesse ser convidado na época para ser o primeiro latinoamericano no Board of Trustees do ICSC, criando, com isso, intimidade com alguns dos maiores empresários deste setor no mundo. “A indústria de shoppings brasileira se tornou uma referência pela qualidade do desenvolvimentos e a criatividade dos empresários do setor. Sinto-me honrado de ter participado desta história”, revela.

Conexão Rio-São Paulo

Na gestão de Paulo Malzoni Filho, entre 2005 e 2006, a Abrasce mudou a sede do Rio de Janeiro para a cidade de São Paulo e apenas três colaboradores foram escolhidos para encarar os novos desafios desta mudança. Segundo o copresidente da Ancar Ivanhoe, foi algo absolutamente natural já que os principais players de shopping centers, embora fossem cariocas, tinham empreendimentos em São Paulo. “A indústria foi tomando mais porte e robustez em São Paulo. Foram dois movimentos estratégicos quase que na mesma época: a ida para São Paulo e a abertura de um escritório em Brasília”, revela. Nesse período, o estado já tinha a maior quantidade de shoppings. O Sudeste continua sendo a região que recebe mais investimentos: 313 shoppings dos 601 ficam em São Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro. 

Algum tempo depois de já instalada na nova sede, a entidade buscou estreitar também o relacionamento com os associados de diferentes partes do país. Mônica Vianna, gerente de relacionamento e insights da Abrasce, conta que os encontros começaram com cafés da manhã organizados na entidade para poder ouvir a opinião e as demandas dos associados que estavam mais próximos fisicamente. “Assim nasceram os encontros com os associados e depois expandimos para viagens. A cada semana convidávamos associados diferentes. Nas primeiras viagens, ouvimos muitas críticas, pois a entidade era muito distante até então de muitos dos associados de outros estados e existiam muitas demandas locais. Não havia essa atuação ativa jurídica de acompanhar os projetos de lei, que passou a ser mais presente a partir do mandato de Luiz Fernando Pinto Veiga. Aos poucos, os encontros foram ganhando mais relevância e frequência e o relacionamento se estreitou. Até hoje a Abrasce os mantém”, fala.

Monica Viana 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers

A partir da constituição dos coordenadores regionais, a Abrasce passou a ter uma liderança em cada estado, aumentando a capilaridade de atuação e facilitando a comunicação e a coordenação estratégica do setor em todo o País. O relacionamento com outras entidades de classe também foi construído ao longo dos anos e, em muitos momentos, essa união e proximidade têm ajudado a passar por crises e a atuar em interesses comuns, especialmente quando se trata de algum projeto de lei que afeta diretamente o mercado e sua cadeia.

A relação com o associado se tornou muito próxima com os encontros, os cursos de capacitação, os seminários e demais eventos organizados pela entidade. E hoje a comunicação é feita pelos mais diversos canais quase em tempo real. Na pandemia, essa proximidade tem se dado à distância e, talvez, até com mais intensidade devido ao momento. Juliana Garbini, gerente de marketing do Continental Shopping, um dos empreendimentos mais antigos da cidade de São Paulo, inaugurado em 1975, diz que a Abrasce tem cumprido o papel de fortalecer o setor e defender o interesse dos shoppings. “A profissionalização do nosso mercado é muito importante e a entidade é um dos principais pilares nesse desenvolvimento por meio da divulgação de conhecimento e compartilhamento das melhores práticas”, diz. 

Mudança na governança

Por 32 anos, a entidade teve como presidente os próprios empreendedores de shoppings. Primeiramente, vieram os precursores do negócio e, depois, seus sucessores, como Renato Rique, Paulo Stewart, Carlos Jereisatti Filho, Paulo Malzoni Filho e Marcelo Carvalho.

Paulo Stewart ainda lembra da época em que os filhos eram sucessores e já estavam envolvidos com a entidade. “Era um privilégio conviver com o que há de mais sólido em termos de formação e conhecimento da indústria com todas essas pessoas. Desde a mudança para um executivo, houve uma profissionalização não só do ponto de vista de pessoas, como também de processos, aprimoramento do papel institucional da Abrasce, que, hoje, tem um peso e uma representatividade muito significativa. É com todo o reconhecimento que faço isso e com o orgulho de ter contribuído para esse percurso de grandeza e aprimoramento”, relata.

Após seu mandato, veio o de Carlos Jereissati Filho, que também concordou e estimulou essa mudança na gestão. “Sempre fui um grande defensor da melhoria da governança da Abrasce no sentido de existir um espaço com empreendedores do Conselho Diretivo e de um executivo acompanhando a associação com dedicação exclusiva. E tudo isso deu maior capacidade de realização da própria entidade”, complementa o CEO da Iguatemi.

Marcelo Carvalho foi o último presidente a ser um empresário do setor entre 2007 e 2008. Seu mandato marcou a expansão do Congresso Internacional de Shopping Centers, que era realizado, até então, em um local pequeno para 500 pessoas. Naquele momento, o Brasil vivia uma época de prosperidade, então, decidiu dobrar o tamanho do evento. Além disso, sempre teve muito foco em educação e treinamentos.

“É uma indústria formada por pessoas extremamente interessantes porque não há uma só fórmula de se fazer shopping center, mas, por outro lado, existem alguns princípios que quase são uma espinha dorsal. Foi muito importante a Abrasce para marcar os empreendedores de uma segunda leva de empresários para que não cometessem alguns erros do passado, como, por exemplo, vender um espaço dentro do shopping center”, explica.

Ele, inclusive, lembra de um painel que o marcou muito em uma das edições do Congresso e que foi ministrado pelos principais empreendedores de shopping do Brasil na época – Sergio Carvalho, José Isaac Peres, Donald Stewart, Célio Pinto de Almeida, Carlos Jereissati -, falando dos erros que tinham cometido em seus primeiros empreendimentos de uma forma extremamente transparente e contributiva.  

Para mudar a governança de um empreendedor para um profissional contratado, a Abrasce precisou mudar o estatuto e, em 2009, Luiz Fernando Pinto Veiga foi o primeiro presidente executivo a assumir essa posição. Seu mandato foi até 2014. Não foi difícil a escolha já que Veiga tinha sido superintendente das bases de São Paulo e do Rio de Janeiro até chegar a superintendência geral da entidade. A partir desse momento, a Abrasce começou a se profissionalizar. “Primeiramente, criei cinco gerências: Atendimento ao Associado, Pesquisas, Educação, Marketing e Administrativo Financeiro. A entidade cresceu demais naquele momento e o Congresso Internacional de Shopping Centers ganhou um patamar mais alto, inclusive, em investimentos, com a presença de palestrantes com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, e o ex-prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani”, conta.

Luiz Fernando Pinto Veiga 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers

Veiga continua seu relato contando que nos últimos anos da sua presidência, como já tinha uma equipe muito forte em cada área, começou a se envolver pessoalmente com a defesa do setor, mantendo contato estreito com a Câmara dos Deputados, o Senado Federal e os legislativos estaduais e municipais. “Era comum membros do legislativo criarem projetos que prejudicariam tremendamente os negócios. Nesse momento, criamos a sucursal em Brasília”, diz. Ao todo, foram 17 anos dedicados à indústria de shopping centers, a qual Veiga considera uma das maiores invenções da nossa era, pois atende os consumidores, os lojistas e os empreendedores. 

Glauco Humai assumiu em 2015 após aceitar o convite da Abrasce e retornar ao Brasil, já que estava trabalhando na China. Além da pandemia, sua gestão também presenciou a grande crise econômica do fim do governo de Dilma Rousseff e início do governo de Michel Temer. “Desde que assumi em 2015 o setor não teve momentos de trégua, diferentemente do período anterior, no qual foi a década de ouro do varejo com crescimento exponencial da atividade varejista e do setor imobiliário, do aumento da renda da população, com inclusão social. Isso começou a acabar em 2013 e 2014, se agravou muito em 2015 quando eu assumi. Felizmente, temos conseguido enfrentar essas dificuldades. E não perdemos associados, ao contrário, conseguimos crescer muito, em mais de 50%, aumentamos o faturamento, a representatividade, a presença em Brasília e em todas as regiões, mas tem sido um desafio constante”, relata.

O mandato de Humai ainda é marcado pela mudança de paradigma do varejo com a transformação digital, um desafio que já vinha há algum tempo. “Criamos uma série de mecanismos e soluções para poder agregar e trazer os associados para esse mundo, ampliando o escopo da Abrasce também nesse mundo digital e tecnológico. Firmamos parcerias, fizemos delegações para o exterior, trouxemos conhecimentos, análises e estudos, contratamos pareceres e pesquisas”, reforça. Recentemente, a entidade lançou a plataforma Empório Clube, primeiro marketplace B2B voltado aos shopping centers e lojistas.

E essa profissionalização da Abrasce coloca a entidade em outro patamar, acima de interesses de grupos e com uma visão holística do setor, contando com uma estrutura e equipe que tem metas, objetivos, e planejamento financeiro, o que aproxima muito mais os shoppings menores e independentes que não fazem parte de grupo da associação. “É uma evolução e um passo muito grande, pois faz com que a associação seja independente de grupos, muito mais ampla e representativa, com uma governança muito mais segura, com processos mais claros e um orçamento mais definido”, destaca Humai. Com essa mudança na gestão, estabeleceu também um canal importante com a imprensa, algo que, no passado, ficava a cargo dos presidentes empreendedores. Manter a sociedade informada é essencial, especialmente em momentos de crise. 

Homenagem aos 45 anos

Para celebrar esse aniversário, a Abrasce lançou uma marca especial que permanecerá durante todo esse ano de celebração e preparou algumas atividades como webinários e palestras, vídeo comemorativo e a edição especial do Prêmio Abrasce 2021 celebrando os 45 anos de história, além dessa reportagem na Revista Shopping Centers, um veículo com mais de 30 anos de tradição para o setor.

Conheça os primeiros shopping de grande porte de cada região

Curiosidades 45 anos Abrasce - Revista Shopping Centers

Relações de sucesso e duradouras

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