NOV/DEZ 2020 - Edição 232 Ano 33 - VER EDIÇÃO COMPLETA

Reforma tributária: como as propostas podem impactar o setor

10 de dezembro de 2020 | por Solange Bassaneze | Fotos: Divulgação
Abrasce monitora o andamento do assunto no Congresso e monta grupo de trabalho para apresentar sugestões ao governo e Congresso Nacional

A reforma tributária segue em discussão no Congresso e as três propostas apresentadas geram impactos diretos em alguns setores, como o de shopping centers. De modo geral, os textos, analisados pela Câmara dos Deputados e pelo Senado, propõem simplificar a arrecadação de impostos, unificando vários tributos. Dessa forma, a carga tributária recebida pelo governo federal, em teoria, seria mantida. O que mudaria seria a forma de arrecadação, que passaria a ser sobre o consumo e não sobre a produção, assim como a redistribuição dos recursos arrecadados. Porém, a contribuição de diversos setores importantes da economia, inclusive o de setor de shopping centers, teria aumento, o que pode impactar toda a cadeia.  

Momento inadequado

O Brasil ainda passa por uma crise econômica e sanitária, por isso, a Abrasce acredita que essa pauta deveria ser adiada. Segundo o presidente da entidade, Glauco Humai, não é viável discutir uma reforma tributária em meio à uma pandemia, já que diversos setores foram profundamente afetados. 

Além disso, não há como se calcular os efeitos econômicos e fiscais que serão deixados no período pós-pandemia, principalmente se for levado em consideração a alta da inflação já anunciada para 2021 e o tímido crescimento do PIB (Produto Interno Bruto).  

Neste momento, os empresários não podem tirar o foco da recuperação de seus negócios e da manutenção dos empregos para debater o tema. “Antes dessa discussão, é preciso ter a aprovação da reforma administrativa, com a detecção do tamanho do Estado e os respectivos cortes de gastos. Posteriormente, podemos conversar sobre um novo modelo de tributação”, reforça ele. 

Diante disso, a entidade montou e está liderando uma equipe de trabalho para levar suas sugestões ao governo e ao Congresso Nacional. Em breve, espera poder apresentá-las. Fazem parte do grupo diretores financeiros de grandes empresas desenvolvedoras de shoppings, economistas e tributaristas. 

“Com esse grupo de trabalho vamos avaliar os impactos macroeconômicos das propostas de reforma tributária – PEC 45/2019, PEC 110/2019 e PL 3887/20. Essas não reduzem a tributação sobre consumo, impactando negativamente nas atividades essenciais para a população como saúde e educação, e nos demais serviços prestados diretamente ao cidadão”, explica Gisele Pimentel, gerente jurídica e de compliance da Abrasce. Por isso, o trabalho da entidade buscou por sugestões factíveis. 

Na PEC 45/2019, por exemplo, a Abrasce enviará sugestões sobre os temas Imposto sobre Bens e Serviços, Aluguel, Creditamento, Repasse de IBS no contrato de locação, entre outros pontos. 

Glauco Humai fala sobre Reforma Tributária e o impacto no setor - Revista Shopping Centers
“A Abrasce aguarda agenda com o relator da PEC 45/2019 para falar sobre o tema e evitar o aumento de carga tributária no setor que emprega mais de 3 milhões de pessoas”, Glauco Humai. 

Sem data marcada

Por enquanto, é necessário aguardar, pois não há data definida para apresentação do relatório final pelo deputado Aguinaldo Ribeiro. Somente após o conhecimento do que realmente será apresentado é que o setor terá condições de se manifestar.

Passado isso, o colegiado será responsável por discutir as propostas, buscando um texto de consenso entre Governo, Parlamento e entes da Federação. O relator se posicionará através de um substitutivo à Proposta de Emenda à Constituição nº 45, de 2019, não deixando, claro, de levar em consideração pontos da Proposta de Emenda à Constituição nº 110, de 2019, e nem mesmo de pontos do Projeto de Lei nº 3887, de 2020.

A previsão do presidente do colegiado é de que a votação ocorra em dezembro. Na avaliação do setor, seria imprescindível que o Congresso Nacional avançasse antes em outras reformas estruturantes, como a Reforma Administrativa, PEC Emergencial, Recuperação das Contas Públicas, para só depois aprofundar a discussão na Reforma Tributária.

“Nenhum país no mundo, hoje, está tentando votar uma reforma tributária, principalmente uma que implique em elevação de impostos sobre o consumo, o que reduziria a demanda e agravaria a recessão econômica. Na verdade, nenhuma reforma estruturante está sendo decidida nestes tempos”, ressalta Gisele. 

Gisele Pimentel fala sobre Reforma Tributária e o impacto no setor - Revista Shopping Centers
Gisele Pimentel, gerente jurídica e de compliance da Abrasce

Impactos

Caso alguma proposta seja aprovada de forma abrupta, que implique em elevação de carga tributária sobre o consumo, agravará ainda mais o cenário atual. “Em alguns setores, como no de shopping centers, não há créditos a compensar. Isso resultará em aumento de custo para os lojistas e, consequentemente, repasse nos preços ao consumidor. E nos setores que possuem essa possibilidade, não há clareza de como isso será feito”, diz o presidente da Abrasce. 

“Os shopping centers estarão entre os mais prejudicados diante da impossibilidade de creditar-se sobre seus maiores gastos”, salienta a gerente jurídica e de compliance. 

Humai e Gisele alertam que o período de transição trazido pelas PEC’s do Congresso Nacional é demasiadamente longo. Desse modo, não será possível observar os benefícios da reforma pelos próximos anos. “Muito pelo contrário, durante a transição, ocorrerá uma maior complexidade na tributação, com dois regimes em vigência. Isso acarretará em aumento de custos de conformidade e de gestão tributária; maior insegurança jurídica; e permanência dos conhecidos problemas das legislações dos atuais tributos até serem extintos em até 10 anos”, adverte Gisele. 

Ainda sobre o período de transição, alguns pontos devem ser observados:
  • O período de transição longo serve exatamente para melhor absorção das mudanças tributárias, principalmente para os contribuintes. Já para os consumidores não faz tanta diferença; 
  • A proposta inicial traz um período de transição longo, fato. No entanto, pode não ser o prazo que seja apresentado ao final. A análise pelo relator serve exatamente para ajustar um período mais razoável;
  • A simplificação do sistema, com a eliminação de contenciosos administrativos e judiciais, contenção da guerra fiscal e diminuição de custos operacionais (contador e compliance), poderá compensar ou até superar eventuais ajustes de carga durante a transição.  

O presidente da Abrasce alerta ainda que o potencial inflacionário está sendo ignorado: a rigidez para baixa dos preços pode não proporcionar redução em setores beneficiados, como a indústria. Por outro lado, os segmentos afetados terão aumento.  

Como os shoppings estão no meio da cadeia produtiva e de comercialização, em tese, a isenção ou mesmo a imunidade, por si só não é a solução imediata. “Nosso setor está estruturado com múltiplos CNPJs. Os empreendedores, se forem contribuintes do IVA, a incidência será a redução de receita; o condomínio sofrerá aumento de custo sobre serviços adquiridos e o Fundo de Promoções e Propaganda tende a ser mais onerado na publicidade adquirida”, explica a gerente jurídica.

Há um outro agravante. Mesmo que não haja aumento de impostos sobre vendas, a tendência é a compra de serviços com custos muito mais elevados como vigilância, limpeza, energia, água, entre outros. “Se o aluguel não for taxado ou, pior, se o for, mas os custos forem incorridos em outro CNPJ, poderá haver um impacto duplo no modelo proposto”, acrescenta Gisele.

“A ocasião exige mecanismos para que se atravesse a crise. Não podemos ter a adoção de medidas que aumentem a complexidade do sistema e da carga tributária em si”, conclui Humai.  

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