A retomada da Almeida Junior em Santa Catarina
O CEO Jaimes Almeida Junior relata como tem enfrentado a crise ocasionada pelo novo coronavírus depois da reabertura de todos os empreendimentos do grupo
Desde março deste ano, o Brasil vem enfrentando a pandemia do coronavírus e os 577 shoppings do país foram fechados por meio de decretos estaduais e municipais. Atualmente, o setor retoma paulatinamente suas atividades, de acordo com as determinações dos governos locais, como é o caso da Almeida Junior.
Neste cenário, Santa Catarina foi um dos primeiros estados retomar as atividades de forma gradual. Os shoppings puderam ser reabertos em 22 de abril, seguindo os regramentos das portarias decretadas pelo governo estadual e pelas autoridades da saúde. Entre elas, estão o horário reduzido, o distanciamento social de 1,5 m, uso de máscaras, respeito ao limite de 50% da capacidade máxima, entre outras. Com grande relevância no estado, a Almeida Junior, que completou quatro décadas em 2020, voltou a operar. Os seis empreendimentos do grupo ficam situados em cinco cidades catarinenses de alto potencial econômico.
Em entrevista à Revista Shopping Centers, Jaimes Almeida Junior, CEO da companhia, fala sobre as estratégias estabelecidas e como tem se dado a retomada dos negócios. Conta ainda quais foram os investimentos feitos em omnicanalidade, as medidas adotadas pelos lojistas para oferecer um ambiente seguro ao consumidor e as expectativas para os próximos meses.
Revista Shopping Centers – Esse é o momento mais difícil passado pela Almeida Junior ao longo de 40 anos?
Jaimes Almeida Junior – Com certeza. Foi realmente um choque diante da impotência de um dia para o outro ver todos os shoppings fechados com mais de 2 mil lojas sem a previsão de abertura e com todas as responsabilidades da nossa atividade.
O empresariado brasileiro já está acostumado a enfrentar solavancos de crises econômicas e políticas e consegue surfar de uma forma muito eficiente. Porém, o que está ocorrendo agora é algo que absolutamente eu nunca imaginei que iria passar. Vivemos uma imprevisibilidade total, que só se resolverá com a vacina.
Diante disso, fizemos uma previsão de 2020 e um budget para 2021, contemplando todas as restrições. A empresa não prevê uma melhoria nas restrições de operações até julho do ano que vem. Espero que esteja errado e conservador demais, porém entendo ser fundamental elaborarmos o nosso planejamento para um cenário realista. É uma situação inimaginável que ocorreu e temos que enfrentá-la, mesmo com muita dificuldade.
RSC – Quais foram as medidas tomadas pelo grupo para ajudar o varejista?
JAJ – Fizemos um investimento de R$ 45 milhões junto aos lojistas. Abonamos o aluguel de março e abril e optamos por não fazer a emissão de aluguel proporcional no futuro. Além disso, reduzimos muito os custos do condomínio e do fundo de promoção. Enquanto os shoppings estiveram fechados, também nos comunicamos com os consumidores pelas redes sociais, oferecendo, por exemplo, cursos de culinária e lives. Nos preocupamos em dar esse atendimento, mesmo de portas fechadas, as janelas ficaram abertas, olhando o nosso consumidor.
RSC – Como se apresenta a taxa de vacância?
JAJ – A taxa de vacância está estável até agora com o mesmo índice do início de março e as poucas lojas que fecharam já estavam dentro da programação. Operações que estavam em obras só puderam ser inauguradas agora com a reabertura dos shoppings. Recomeçamos também o processo de comercialização. Estamos vendo uma retomada, mas sem comparar com o que nós tínhamos planejado.
RSC – As expansões previstas foram adiadas?
JAJ – Sim, já tínhamos iniciado a expansão do Balneário Shopping, mas suspendemos todos os brownfields. A companhia terminou o primeiro trimestre com resultados muito bons, estávamos no processo de Oferta Pública Inicial (IPO) com valuation excepcional da empresa. A nossa agenda era absolutamente positiva quando fomos atropelados. Suspendemos o IPO, mas mantivemos o registro na Comissão de Valores Imobiliários (CVM) por mais 180 dias por meio de uma portaria que permite esse prolongamento do prazo. Pode ser que as janelas de IPO reabram no quatro trimestre desse ano, então, trabalhamos com essa perspectiva.
RSC – Como tem se dado a transformação digital neste momento?
JAJ – Precisamos voltar à normalidade muito mais digitais e temos acelerado o omnichannel. A companhia já estava com um projeto de market place, previsto para inaugurar no quarto trimestre do ano que vem. A programação era acompanhar o market place das demais empresas do setor e fazer um aperfeiçoamento para lançar a nossa plataforma mais testada.
Com o fechamento dos shoppings, montamos um novo time e a plataforma será lançada na primeira semana de setembro. Enquanto isso, implantamos o WhatsApp corporativo. Ele oferece três tipos de entrega (pick up store, drive-thru e delivery) com pagamento on-line e o lojista pode integrar seus vendedores. Sem dúvida, todas as companhias seguem a mesma linha. Eu não acredito no mercado on-line sem o off-line – está provado que o off-line é a âncora e o on-line é o complemento. Entendemos que a Covid-19 antecipou essa agenda e o market place passou a ser prioridade.
RSC – Como está sendo a experiência da reabertura?
JAJ – Voltamos a operar em 22 de abril, seguindo rigorosamente as normas de segurança e saúde. A companhia fez um investimento importante para que consumidores, colaboradores e lojistas se sentissem seguros. Essa sensação é essencial para que o cliente volte e a equipe trabalhe em tranquilidade. Entregamos máscaras personalizadas de algodão e luvas para todos os lojistas, seus colaboradores e funcionários dos shoppings. Dispensers de álcool em gel foram colocados em todas as áreas do shopping e passamos a usar uma solução esterilizante SCST (Sterile Doctor) nas superfícies de contato.
Registramos um fluxo médio na primeira semana de reabertura de 35%, com vendas médias de 40% em relação a 2019. Na semana anterior ao Dia das Mães, o fluxo médio foi de 45% e vendas de 65% em relação ao mesmo período do ano passado. As âncoras, as médias lojas e satélites nacionais tiveram vendas médias de 70% a 80% em comparação a 2019. Realizamos pesquisas com as nossas câmeras de reconhecimento facial e detectamos que o consumidor vai ao shopping para comprar e depois vai embora.
Nosso horário de funcionamento está reduzido, das 12 às 20 horas de segunda a sábado e domingos e feriados das 14 às 20 horas. A abertura das operações de alimentação das 20 às 22 horas é facultativa. Nada mudou também em relação a entrada de pets. Podem acessar o shopping normalmente.
“Eu tenho uma leitura nem um pouco preocupante no que tange ao retorno do consumidor, algo muito debatido hoje.
A volta está mais ancorada na essência das pessoas, na socialização e também no fato de terem sido tolhidas de exercerem sua liberdade”
RSC – Qual foi a ação solidária realizada pela Almeida Junior para ajudar no combate à Covid-19?
JAJ – A Almeida Junior anunciou no início de maio a doação de 12 respiradores para a rede pública de saúde de Santa Catarina. Como nossa marca é muito forte no estado, o mínimo que poderíamos fazer era contribuir com a sociedade e com os hospitais. Os respiradores foram importados da Alemanha e doados para hospitais públicos de Blumenau, Joinville, Balneário Camboriú, São José e Criciúma.
RSC – Facilita ter uma equipe orgânica no momento de uma crise sanitária?
JAJ – Facilita demais. É totalmente diferente treinar um time, em que todos são funcionários da companhia para ter o comprometimento com o negócio. Nosso corpo social tem mais de 2 mil pessoas fixas, sendo que, em sua maioria, são funcionários de mall, de limpeza e de manutenção. Trabalhamos muito o treinamento e o nível de disciplina e o comprometimento de um funcionário orgânico se demonstrou extremamente positivo.
RSC – De que forma vocês ajustaram as contas da companhia?
JAJ – Usamos as medidas oferecidas pelo governo. Como reabrimos, acredito que qualquer ação mais drástica de demissões só deve ocorrer, caso seja necessário, apenas quando provado com alguns meses de operação. Estamos avaliando e aferindo cada movimento e acompanhando o crescimento do fluxo e das vendas. Estamos analisando também como fica a operação mais enxuta com funcionários em home office. Não sei em que proporção, mas deve ser feito um ajuste nos próximos meses.
Renegociamos o contrato do Mercado Livre de Energia, pagando exclusivamente o consumido, pois isso atinge diretamente o custo do condomínio, consequentemente, o lojista. Vários contratos de serviços foram renegociados. Como nossa companhia ainda não é pública, tivemos muita agilidade em fazer isso. As tomadas de decisão foram realizadas até o final da primeira semana do fechamento dos shoppings.
RSC – Já para prever quando tempo levará para recuperar as perdas deste período ou ainda não é possível mensurar?
JAJ – Cada caso é um caso. Acredito que os shoppings em cidades grandes terão uma curva de retorno um pouco mais lenta. Já shoppings dominantes em cidades médias e ricas, o retorno será em V. Temos 71% do market share catarinense, com shoppings dominantes, em cidades do interior ricas e grandes. Por isso, creio em um retorno em V e isso será muito importante para a companhia.
Além das características do nosso mercado, o fato de termos iniciado antes e os nossos lojistas terem ganhado fôlego com o Dia das Mães me levam a acreditar em uma recuperação rápida, a partir da vacina. Até lá, vamos continuar nesta toada, crescendo um pouquinho, limitando a ocupação porque temos que respeitar o decreto, ou seja, o shopping não pode ter mais 50% do normal de ocupação. O importante é que está sendo um fluxo de qualidade.
RSC – Acredita que esse momento mostrará mais uma vez como o setor de shopping centers é resiliente?
JAJ – O isolamento faz as pessoas valorizarem muito mais a sociabilidade. Você valoriza muito aquilo que você perde. Nós somos sociáveis, é da natureza humana e isso ninguém vai tirar. O setor de shopping centers no Brasil terá um retorno de fluxo a partir do momento que as pessoas tiverem uma segurança muito grande. A indústria vai ter o privilégio da saudade. O fato de não poder sair de casa enaltece demais a nossa essência de socialização.
Vamos ter mudanças de comportamento como fazer uma compra por touch em uma roupa, algo que não se fazia como shopper. O setor de shopping vai ter um grande retorno. A inovação e o digital vão também evoluir de uma forma positiva, inclusive, para a rentabilidade dos empreendedores. Por exemplo, nós assinamos em março um contrato com o iFood hub, um sistema de delivery bem mais eficiente.
Então, cada grupo procurará dentro de sua expertise e estratégia oferecer o melhor para o consumidor, além de aperfeiçoar o omnichannel, que estava muito na teoria e com uma prática mais provocada pelas lojas. Agora, cabe ao shopping ser o protagonista da omnicanalidade, ajudando, inclusive, os lojistas pequenos que não têm essa capacidade.