MAI/JUN 2023 - Edição 247 Ano 36 - VER EDIÇÃO COMPLETA

Carrefour Property estuda novos investimentos em greenfields

7 de junho de 2023 | por Por Solange Bassaneze / Fotos: Divulgação
São 50 projetos mapeados, aproveitando o potencial construtivo remanescente do landbank

Unidade de negócios do Grupo Carrefour Brasil, o Carrefour Property atua na gestão e desenvolvimento do portfólio imobiliário da companhia e pretende rentabilizar terrenos e valorizar ainda mais seus ativos a exemplo do complexo multiuso Paseo Alto das Nações, desenvolvido em parceria com a incorporadora WTorre, na capital paulista, que teve sua primeira fase inaugurada em dezembro de 2022. 

Após a aquisição do Grupo Big, passou a ter 500 imóveis próprios. Além disso, o Carrefour Property administra 370 galerias comerciais pelo Brasil, com mais de 4 mil lojistas, e quatro shoppings: o Butantã Shopping, o Jardim Pamplona Shopping, ambos em São Paulo (SP), o Paseo Joinville, em Joinville (SC) e o Boulevard Shopping, em Brasília (DF), esse último locado para outra administradora.

Mais greenfields estão mapeados e outros seguem em estudo, segundo a CEO do Carrefour Property, Liliane Dutra. Em entrevista à Revista Shopping Centers, a executiva fala sobre o potencial do landbank (banco de terrenos) e de outros assuntos como a importância da inteligência de dados no varejo, o diferencial de ter a ancoragem própria, as intervenções em shoppings, a mudança de comportamento do consumidor, a relevância da agenda ESG (Environmental, Social and Governance) e da representatividade feminina na alta liderança feminina, os avanços no estudo de carve-out companhia, entre outros pontos. Confira!

Revista Shopping Centers – O Carrefour Property faz a gestão e o desenvolvimento do portfólio imobiliário da companhia. O que muda quando falamos de shopping centers dentro deste leque tão grande de ativos e de que forma existe uma sinergia entre eles? 

Liliane Dutra – Temos 370 galerias, totalizando 420 mil m2 de ABL, e quatro shopping centers, sendo que três deles são shoppings formais e estamos fazendo um ajuste na escritura declaratória do quarto, mas que tem porte de shopping. São empreendimentos menores do que os regionais, então, entram no perfil de vizinhança. As galerias são um produto muito particular e até usamos métricas da Abrasce para entender suas performances e rentabilidade, mas são completamente diferentes de um shopping center. Na diretoria de gestão e comercialização de shopping, temos a Fernanda Rodrigues, que vem do segmento de shopping e trabalhou por 25 anos nas companhias Multiplan e Brookfield. Desde que vim para o Carrefour Property, tento trazer as boas práticas do mercado de shopping center para que possamos fazer a gestão das galerias da melhor maneira possível. Nas galerias, nosso lojista é menor e menos sofisticado, além disso, estamos também em mercados muito pequenos, localizados em cidades menores. É muito interessante porque o Carrefour Property é praticamente o único player do Brasil com esse portfólio.

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Liliane Dutra, CEO do Carrefour Property
RSC – Por atuar desde 1999 no setor de shopping centers, o que foi mais desafiador ao assumir o cargo de CEO do Carrefour Property já que era um momento ainda com os impactos da pandemia?

LD – Quando eu entrei, as galerias já estavam abertas, mas ainda existia a famosa ‘ressaca’ pós-pandemia. Diferentemente do core business da companhia, que são os supermercados e permaneceram abertos, as galerias ficaram fechadas. Por termos um perfil de lojistas pequenos, a capacidade de fluxo de caixa para encarar esse período de fechamento também foi menor do que uma rede estruturada. Até hoje estamos recompondo essa vacância. E muito parecido com o que aconteceu no setor de shopping, o segmento de alimentação sofreu bastante. Então, temos ressignificado algumas galerias para um perfil mais de serviço do que já existia. Em galerias que tinham praça de alimentação, estamos colocando ancoragem de serviço, como Decathlon, Leroy Merlin, Kalunga…

RSC – Houve alguma mudança no Paseo Joinville desde a aquisição do Grupo BIG pelo Grupo Carrefour Brasil? 

LD – Fizemos uma ressignificação do nome, usando a mesma nomenclatura de Paseo, que implementamos no Paseo da Alto das Nações, então, já teve um ajuste de marca dele. E obviamente da gestão. Estamos fazendo estudos de ressignificação de áreas dele, mas é um empreendimento pequeno e só existe por conta do supermercado, que já foi convertido para o Carrefour. 

RSC – No ano passado, o Carrefour anunciou os estudos para um potencial ‘carve-out’ de sua unidade de negócios imobiliários. Isso avançou?

LD – Estamos trabalhando nisso. É um processo lento que requer uma diligência muito grande, então, estamos fazendo um grande trabalho interno para que tenhamos essa empresa imobiliária estruturada fora da empresa operacional.

RSC – Quais são as principais vantagens de ter shoppings ancorados pelos hipermercados que são da companhia?

LD – Diferentemente do gestor de shopping centers, nós somos gestores de galerias, onde o hipermercado é o grande atrativo. Por conhecemos os hábitos de compra dos nossos consumidores, conseguimos ser muito mais assertivos na entrega de um mix, usando a inteligência de dados. É um diferencial competitivo enorme que estamos começando a explorar de uma maneira mais científica. É algo que nenhuma gestora de shopping tem. 

RSC – No Jardim Pamplona Shopping e no Paseo Alto das Nações, os endereços eram ocupados antes por uma operação do hipermercado Carrefour, o que levou a investir nesses pontos já que a companhia tinha também outros ativos com potencial?

LD – São Paulo é o centro nervoso do país e não tem lugar melhor para se fazer negócio. O Jardim Pamplona Shopping fica em um dos lugares mais premium da capital paulista, nos Jardins. Tínhamos apenas a loja, mas já existia uma ‘caixa pronta’, pois foi planejada para ser uma loja de departamento com hipermercado, desenvolvida em um primeiro momento por uma rede de supermercado. Quando o Carrefour o comprou, foi feita uma reforma sem acréscimo de área com aproveitamento do que já estava aprovado como potencial construtivo. Por isso, ele é um pouco mais vertical e tem alguns pontos que o engessaram em termos de circulação. 

O Paseo Alto das Nações está localizado em um terreno com quase 65 mil m2 em uma área que passou por uma transformação com o passar dos anos, sendo desenvolvida como uma região de trabalho, mas, hoje, também com uma vocação residencial. Fica em confluência com a Marginal Pinheiros e a estação de trem Granja Julieta, tendo um potencial construtivo muito grande pelo zoneamento da cidade. Por isso, desenvolvemos um projeto muito mais ambicioso e audacioso e não simplesmente uma reforma com acréscimo de área. Por isso, foram construídos uma loja nova com um pequeno mall e três torres: corporativa, residencial e mista. 

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O Jardim Pamplona Shopping conta com um mix compacto e completo com marcas nacionais e internacionais
RSC – O complexo Paseo Alto das Nações teve sua primeira fase inaugurada em dezembro de 2022. Gostaria que me contasse como tem sido esses primeiros meses de operação e se os resultados estão dentro da expectativa.

LD – Desenvolvemos um hipermercado de primeira linha para ser o melhor do Brasil. Já tínhamos uma galeria antes, que era bem-sucedida com zero de vacância e com serviços adjacentes ao hipermercado. Então, o mall é um complemento a esse conjunto. A segunda etapa do complexo multiuso engloba a inauguração das torres corporativa e residencial. A praça pública com 32 mil m2, coração do Paseo Alto das Nações, ficará pronta também. A integração urbana é muito bem-feita, além de ter um espaço público generoso.

Com a densificação das três torres de uso diferentes, vamos ter gente morando, trabalhando e com passagem temporária. Ainda não estamos com os prédios funcionando, apesar de uma torre estar pronta, pois a parte de long stay ainda não foi inaugurada. A boa notícia é que não perdemos fluxo, mesmo estando ainda em obras. Quando tiver o público, esse tráfego aumentará mais ainda. 

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O hipermercado Carrefour do Paseo Alto das Nações passou por revitalização e se tornou referência no país, justamente onde a multinacional francesa abriu sua primeira unidade no Brasil em 1975
RSC – Está nos planos da companhia investir em greenfields nos próximos anos? 

LD – Uma das vertentes do nosso projeto imobiliário é também aproveitar esse potencial construtivo remanescente que temos em nosso landbank (banco de terrenos), então, vamos fazer mais projetos multiuso com vocações dependendo de cada praça. O processo de desenvolvimento imobiliário é bem longo, temos no pipeline 50 projetos bem mapeados do tamanho do Paseo Alto das Nações e estamos estudando mais 90. A partir do ano que vem, entramos no processo de esteira de aprovação com parceiros estratégicos para fazer esse desenvolvimento.

RSC – O Butantã Shopping é o ativo do segmento mais antigo do portfólio. Existe algum plano de expansão ou revitalização envolvendo esse empreendimento?

LD – O bairro do Butantã mudou muito hoje, brincamos que é o novo bairro Pinheiros migrando para lá. Ele tem um perfil muito bacana com uma mudança demográfica importante. Estamos focando em uma reestruturação do mix voltado para o entretenimento de lazer e família e também iremos revitalizar a fachada. Temos como desafio o segundo pavimento, pois tem um tráfego baixo, mas, muito em breve, poderemos divulgar que será do entretenimento da família e atenderá muito bem ao entorno. Se fecharmos o contrato, conseguiremos inaugurar isso tudo até o final do ano. 

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Butantã Shopping, primeiro shopping da divisão do Carrefour Property, inaugurado em 1994, deve passar por mudanças de mix e revitalização da fachada. O shopping recebe cerca de 800 mil visitantes por mês e conta com mais de 30 mil m2 de ABL 
RSC – As vendas on-line já estavam consolidadas no Carrefour antes da pandemia. Mas gostaria de saber se foram feitos novos investimentos na digitalização durante a crise sanitária.

LD – Para as galerias, não existe esse projeto, pois estamos olhando para a digitalização sob a ótica da automação, buscando a eficiência operacional. Na questão de eficiência energética, por exemplo, temos investido em energia renovável com painéis solares. Nos greenfields do Atacadão, por exemplo, eles geram cerca de 35% do consumo de energia de uma loja. É impossível sermos autossuficientes porque precisamos mantê-los ligados 24 horas por conta do consumo do frio alimentar, diferentemente dos shoppings, em que se desliga o ar condicionado à noite. 

O e-commerce será sempre do varejo, atacarejo e clube alimentar. Para as galerias, ter um delivery, uma entrega por WhatsApp, isso é o de full. Conseguimos plugar a galeria dentro marketplace do Carrefour rapidamente, então, algumas praças terão isso, enquanto em outras, não fará sentido. 

RSC – Houve uma mudança de comportamento do consumidor, acelerada pela pandemia. Como os shoppings têm se adaptado aos novos hábitos dos clientes?

LD – A valorização da compra presencial pós-pandemia ficou muito forte e a recorrência de compras aumentou. O hipermercado, o atacarejo e o clube Sam’s Club têm uma missão de estoque, o supermercado de reposição e o express de conveniência. Temos o mesmo consumidor que pode comprar em todos eles. Coincidentemente isso afeta as galerias, quando vemos o aumento da recorrência de compra, ela acontece nas duas pontas das classes sociais. As de classes mais alta com famílias menores compram com mais frequência porque não precisam estocar, porém, em um momento inflacionário, o estoque acaba acontecendo, porque o mundo está vivendo um período de inflação. Então, temos que capturar isso também nas vendas das galerias e dos shopping centers, que são ancorados por isso. Daí, temos essa oportunidade de ter o varejo alimentício como a nossa grande âncora, porque conseguimos entender perfeitamente esses comportamentos, antevendo tendências. Para sermos preditivos, estamos trabalhando muito para termos bancos de dados inteligentes e conseguiremos fazer isso muito breve. 

RSC – Agora falando de ESG (Environmental, Social and Governance), como está a agenda 2030 do Carrefour Property e, por ser uma empresa de capital aberto, como apresenta esses dados ao mercado? 

LD – O ESG no Carrefour não é uma obrigação de balanço, é uma missão. Na questão ambiental, há o uso de energias renováveis, redução da emissão de gases dos compressores de refrigeração… Em governança, o Carrefour é tido como uma das empresas que têm maior transparência. O social é o nosso pilar mais forte, por sermos o maior empregador privado do país, gerando 150 mil empregos diretos, com políticas de equidade de gênero, de inclusão social… E a agenda antirracismo é gravada em pedra no Carrefour. Então, apresentamos os relatórios, mas mais do que isso, é um compromisso de cada um dos colaboradores da companhia é de vestir essa camisa e ser embaixador. O Brasil é um país em desenvolvimento, sabemos que temos questões estruturais muito sérias, mas precisamos ajudar e ser ajudado pela sociedade para melhorar esse país nos três pilares: de governança, meio ambiente e responsabilidade social. 

RSC – O que acredita que sua posição na alta liderança em uma multinacional com o porte do Carrefour significa para o time da companhia e o que representa de ganho para a sociedade?

LD – Somos em 11 no Comitê Executivo e temos quatro mulheres. Nunca trabalhei em uma empresa que tivesse uma representativa feminina no Comex como o Grupo Carrefour. Está bom? Não. Tínhamos que ter meio a meio, no mínimo, mas é uma empresa que tem isso muito forte. 

Recentemente, foi criado um programa de mentorias para as mulheres, o Grupo Carrefour Com Ellas, idealizado por Cátia Porto, vice-presidente de Recursos Humanos da companhia. Te confesso que é uma das melhores coisas que já fiz na minha vida, pois sempre quis ajudar a nova geração. Durante a minha trajetória, nunca tive esse apoio e uma mulher para me espelhar, e muito menos sabia que havia uma oportunidade de igualdade porque o peso de se provar sempre tem que ser o dobro do esforço dos homens, no mínimo. Em maio, aconteceu a formatura da segunda turma com 750 mulheres, a primeira teve 500 participantes. Quando as inscrições são abertas, as vagas são preenchidas em menos de três minutos. 

Eu, a Cátia, a Ana Luísa Hieaux, general counsel, e Maria Alicia Lima Peralta, diretora executiva de Relações Institucionais e de Comunicação Corporativa, fazemos a mentoria. O programa tem duração de dois meses e as aulas semanais são on-line. As 40 participantes que mais se destacam fazem uma mentoria pessoal com uma de nós quatro por mais dois meses. Agora, estou com um grupo de 10 da primeira turma. Na próxima, vou ter 15 ou 18. No final, espero que possamos multiplicar e chegar às 75 mil mulheres que trabalham no Carrefour. É um programa para quem se identifica como gênero feminino, então, temos pessoas trans nessa mentoria também. No encerramento da segunda edição, eu disse que tenho a sensação de que estou no lugar e na hora certa. Foi difícil, o caminho foi árduo, mas eu estou muito feliz de estar vivendo esse momento. 

RSC – Gostaria que fizesse uma breve análise do desempenho do Carrefour Property no ano passado e me contasse como está a expectativa para 2023.

LD – O ano passado foi bom. A pós-pandemia mostrou um valor enorme de poder estar junto. Agora em 2023, temos o primeiro ano do mandato presidencial após as eleições, o mundo passando por uma guerra, as restrições ainda da China… Então, existem milhões de dúvidas, mas, o Brasil é um país resiliente e somos uma companhia extremamente sólida. Fizemos uma aquisição importantíssima no ano passado, do Grupo BIG, terminaremos as conversões de loja e a consolidação em junho. Dobramos de tamanho e, em 12 meses, conseguimos integrar tudo. Então, vejo com otimismo e bastante trabalho. 

RSC – Como avalia o papel da Abrasce em defesa do setor?

LD – É uma entidade superimportante e relevante. Conseguiu sensibilizar até a opinião pública em relação ao papel do shopping center formal e também ajudou muitas empresas do setor a fazer uma migração também voltada ao entretenimento e lazer. Além disso, sempre teve um compromisso com os cursos e a educação para o varejo. Como shopping center é uma mistura de imobiliário com varejo, a associação conseguiu mostrar isso. É uma entidade que olha para frente, que tenta trazer o que há de melhor de boas práticas.

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