Uma década promissora para o varejo
Conversamos com executivos dos maiores grupos de shopping centers do Brasil para falar das conquistas obtidas pelo setor e sobre as perspectivas para o ano de 2020
No último ano, o setor de shopping center registrou crescimento de 7,9% nas vendas, com um faturamento de mais de R$ 192 bilhões. Os resultados positivos foram os melhores dos últimos cinco anos, o que comprova a força deste mercado, mesmo diante de um cenário político e econômico instável.
Para esse ano, as perspectivas permanecem altas. Se os sinais de recuperação econômica seguirem as previsões de especialistas, inclusive com a possibilidade de aprovação das reformas no Congresso, os shopping centers deverão surfar na crista dos índices positivos.
No entanto, para que isso se concretize, os empreendedores ainda têm algumas lições de casa para fazer. Afinal, no mar de oportunidades que o ano de 2020 traz, os desafios não são pequenos. E, assim como no oceano, quanto mais veloz e durável for o vento, maior será a altura da onda.
“Vemos boas perspectivas para o Brasil em 2020 e o setor de varejo pode refletir esses avanços. Para isso, será preciso manter as iniciativas de desburocratização e estímulo ao investimento privado, que tragam segurança jurídica, com foco em agendas importantes, como políticas de controle de gastos públicos e voltadas para a segurança nas cidades”, pontua Vander Giordano, vice-presidente institucional da Multiplan.
De acordo com o empresário, o ritmo de crescimento dos negócios também será impactado pela estabilidade dos indicadores econômicos, baixas taxas de juros, inflação controlada e programas de estímulo à geração de empregos no país. “A confiança que o mercado investidor externo tiver sobre o Brasil também irá ditar a velocidade do desenvolvimento do setor”, acrescenta.
Para Leandro Lopes, diretor de Operações da Aliansce Sonae, o varejo está em um momento de otimismo e retomada de crescimento, reflexo da melhoria do ambiente econômico.
“O ano passado marcou o início da recuperação da economia e, consequentemente, do varejo. Houve melhora no poder de compra do consumidor e aumento de fluxo e vendas em nossos shoppings, além da queda na inadimplência e aumento na taxa de ocupação. Isso se refletiu no crescimento consistente de nossos resultados operacionais”, relata Lopes.
Negócios omnichannel
A dúvida que gira em torno do debate sobre a união dos mundos on e off-line parece ter chegado ao fim. Empreendedores já entendem a importância de trabalhar a convergência dos dois canais e ambientes para atrair e atender os novos hábitos dos consumidores.
Marcos Carvalho, co-presidente da Ancar Ivanhoe, acredita que o ano de 2019 tenha sido de diversificação. Segundo ele, ficou claro para todos os grandes players do mercado que os shoppings se tornaram um ponto de encontro de pessoas, local de convivência e conveniência.
“Isso significa que, cada vez mais, o pilar de entretenimento, gastronomia e serviço vem ganhando força no ambiente do shopping center, e ferramentas, como gamificação, aplicativos e serviços de delivery têm se tornado peças fundamentais para transformar o varejo, integrar as operações e tornar as experiências dos consumidores mais personalizadas, interativas e multicanais”, explica Carvalho.
A partir das demandas deste mercado cada vez mais conectado, o grupo aumentou as funcionalidades dos aplicativos dos shoppings, criando mais relevância para o consumidor.
“Hoje, é possível ter acesso a descontos exclusivos, pagar estacionamento, localizar vagas e ficar por dentro dos eventos do shopping, por exemplo. Com essas mudanças, já conseguimos atingir mais de 1 milhão de downloads”, revela o executivo.
A integração dos mundos físico e digital também fez parte da estratégia de negócios da Multiplan. No ano passado, a companhia lançou o superapp Multi, que leva mais conveniência para os consumidores e torna a experiência no shopping ainda mais completa para os visitantes. “O varejo segue em transformação e temos que nos atualizar constantemente. As pessoas têm buscado cada vez mais experiências, serviços e empresas que deixem claro seu propósito de negócio e que estejam integradas com projetos de inovação, sem descuidar da sustentabilidade”, explica Giordano.
Experiência do consumidor
Ao longo de seus 55 anos, o setor de shopping centers soube não apenas valorizar o que o tempo de vida já trouxe, mas reconhecer os aspectos positivos desta experiência.
Mais que isso, as lições aprendidas até aqui prepararam os executivos para os desafios que ainda estão por vir. E o ano de 2019 já mostrou que eles vêm. Adequar o shopping para oferecer experiências únicas aos clientes, seja investindo em mix de lojas ou ampliando as inovações dos empreendimentos, apostando na multicanalidade, por exemplo, já deixou de ser um diferencial. É o que os adeptos dos estrangeirismos chamariam de “must have”.
Pensando nisso, no ano passado, a Aliansce Sonae fechou parcerias estratégias com o Ifood, criando hubs de delivery nos shoppings, e também com o BeGreen, em uma iniciativa exclusiva no segmento, instalando fazendas urbanas para produção de hortaliças frescas e sem agrotóxicos nos estacionamentos dos empreendimentos.
“Também nos unimos à Fábrica de Startups, com o objetivo de acompanhar as tendências do varejo e do setor de shopping centers, além de desenvolver soluções para os desafios da companhia. Nosso grande propósito é reforçar nos empreendimentos do grupo o conceito de life center, concentrando experiências em um só lugar”, comenta o diretor do grupo.
Além disso, com o objetivo de ampliar as experiências positivas, a Multiplan aumentou a participação em alguns ativos, modernizou novas áreas dos shoppings e aperfeiçou o mix das lojas. Como exemplo, o BH Shopping, primeiro ativo desenvolvido pela companhia, celebrou 40 anos de operação e passou por revitalizações que seguem as tendências futuras do setor. E tudo isso com o olhar voltado à sustentabilidade, outro conceito que ditará as regras de consumo daqui para frente.
“No ano passado, inauguramos um conjunto de usinas fotovoltaicas com o objetivo de gerar 100% de energia para o shopping VillageMall. Além de proporcionar economia na conta de luz, a construção do sistema vai evitar a emissão de mais de 227 mil toneladas de gás carbônico ao longo de 25 anos de operação – o que equivale ao plantio de 418 mil árvores”, explica o vice-presidente institucional da companhia.
Perspectivas para 2020
Se o último ano trouxe conquistas importantes para os shoppings, os próximos têm tudo para ser mais promissores – e, ao que tudo indica, mais tecnológicos. Para a Ancar Ivanhoe, as oportunidades são variadas, muito por conta da localização privilegiada dos shoppings nos centros urbanos.
“Isso permite que sejamos parceiros estratégicos para a logística do e-commerce dos varejistas, principalmente na última etapa de entrega dos produtos”, comenta Carvalho.
Por este motivo, o grupo já tem previsto mais de 12 shoppings que ganharão neste ano a instalação de pontos físicos para a retirada de pedidos online, seja no estacionamento ou próximo às saídas de parceiros, como Ifood e Delivery Center. “Esse é um modelo de negócios que é bom para todas as partes: lojistas e restaurantes vendem mais, sem a necessidade de aumentar suas estruturas físicas, e o usuário ganha em agilidade e comodidade”, explica o executivo.
Tecnologicamente, a aposta vem em forma de ferramentas que permitam experiências criativas que realmente conectem o empreendimento com seu público. “O varejo passa por um momento de transformação e perderá espaço quem ignorar a rapidez com que essas mudanças devem ser feitas. Gamificação, realidade aumentada e um mundo de novas possibilidades se abrem quando entendemos que a tecnologia é o meio pelo qual podemos impactar nossos clientes de maneira divertida, humana e interativa”, conclui Carvalho.
Olhando para o cenário econômico e político, para o executivo da Multiplan, a esperança é de que as propostas da reforma tributária que têm tramitado no Congresso estejam focadas na simplificação da cobrança de tributos e na redução da carga para todos os setores produtivos. “Comércio e serviço são hoje os grandes responsáveis pela empregabilidade no país e não podem ser penalizados no processo”, diz Giordano.
Na visão do empresário, outro tema que precisa ser anotado se refere à excessiva produção de leis e normas que inviabilizam o empreendedorismo no Brasil. “A burocracia excessiva em uma época em que o avanço da tecnologia requer uma agilidade e atualização constantes impede que o setor possa contribuir ainda mais com a produção nacional”, conclui.
Para o diretor da Aliansce Sonae, a melhoria do ambiente econômico se reflete na retomada de crescimento do setor. “Os lojistas estão mais consolidados e o setor de franquias está crescendo em patamares elevados. Além disso, algumas companhias abriram capital em 2019, como Vivara, Centauro e C&A, e há um plano consistente de expansão em muitas marcas. Com isso, já estamos observando uma demanda maior por espaços nos shoppings e um cenário mais promissor para os próximos anos”, comenta Lopes.
No entanto, nem só de boas expectativas vive o mercado. Empreender, neste caso, é sinônimo de agir. O que fica de lição é que, seja para transpor os shoppings para além das barreiras físicas ou transformá-los no espaço desejado pelos consumidores, o tempo de mudança é agora. O futuro, com o perdão do clichê, já chegou!