MAI/JUN 2022 – Edição 241 Ano 35 - VER EDIÇÃO COMPLETA

Criptomoedas conquistam mais espaço no mercado

23 de junho de 2022 | por Solange Bassaneze | Fotos: Divulgação

A adesão à criptoeconomia aumentou nos últimos anos, especialmente durante a pandemia porque promove um meio de pagamento rápido e seguro, além de investimentos lucrativos

Apenas no Brasil, a criptoeconomia movimentou cerca de U$150 bilhões no ano passado o que aponta para um futuro próximo em que mais essa moeda fará parte da nossa realidade. Com o mercado em crescimento, no final de abril de 2022, o Senado aprovou o texto sobre a regulamentação de criptomoedas no país, que, além de trazer diretrizes para a prestação de serviços de ativos virtuais, que não se enquadram na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), cria o Cadastro Nacional de Pessoas Expostas. Agora, o Projeto de Lei seguiu para a votação na Câmara dos Deputados. 

Mercado Bitcoin, OWS Brasil, Zro Bank, Foxbit e bitblue são algumas das empresas de criptoativos atuantes no Brasil. Mas existem muito mais, o que levou à fundação, em 2017, da Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABCripto), que reúne os diversos players do mundo, fazendo a interlocução com o poder público e executando ações em prol do desenvolvimento tecnológico.

Quando a primeira moeda digital surgiu em 2008, a Bitcoin, o principal objetivo era que fosse utilizada como meio seguro e ágil de pagamento na internet. Isso aconteceu primeiramente em países da Europa e nos Estados Unidos. Pelo perfil mais conservador do brasileiro, no início, o ativo foi visto mais como um investimento por sua valorização e crescimento. Não demorou muito para surgirem outros criptoativos e a adesão tem sido cada vez mais rápida. Segundo Humberto Andrade, trader do Mercado Bitcoin, esse crescimento se deve porque se percebeu que existem empresas sérias que geram empregos e pagam impostos no país, aumentando a confiança. “Começamos 2018 com 1 milhão de clientes, chegamos a 3 milhões em setembro de 2021 e esse número já saltou para 3,4 milhões em março deste ano”, explica. Existe uma evolução também do uso como meio de pagamento. 

Humberto Andrade, do Mercado Bitcoin, fala sobre criptomoedas - Revista Shopping Centers
Humberto Andrade, trader do Mercado Bitcoin

E a aceleração digital da pandemia refletiu nesse mercado. No Mercado Bitcoin, novas moedas ou criptoativos foram sendo listados na plataforma, que é a maior da América Latina, e hoje chegam a 140. Segundo Bernardo Srur, diretor da ABCripto, foi a partir de 2019, que o comércio brasileiro se tornou mais receptivo a receber cripto como meio de pagamento, devido à ascensão e à entrada de novos players, ao mesmo tempo em que houve a queda do mercado de capitais. Houve um movimento global de aceitação, inclusive também para fazer reservas de valor. “Em 2020, a MicroStrategy, por exemplo, faz sua primeira aquisição de US$ 1 bilhão em criptomoedas para compor sua estratégia de tesouraria. O Elon Musk, cofundador da Tesla, também passou a comprar e, depois, receber cripto, possibilitando que o consumidor adquirisse um carro da marca com a moeda. Um movimento massivo desses players institucionais refletiu no comércio brasileiro, que começou também a expressar apreço. No fim de 2020 e início de 2021, algumas incorporadoras de imóveis, revenda de automóveis e outros comércios já estavam aceitando criptoativos como meio pagamento”, relembra Srur. 

O Mercado Bitcoin, que transacionou pouco mais de R$ 64 bilhões apenas em Bitcoins no Brasil, firmou uma parceria com a concessionária digital NetCarros, uma startup do Grupo DNR, pela qual tornou possível comprar qualquer veículo da plataforma com criptomoedas. “Desde 22 de março, os pagamentos já estão sendo feitos com todas as moedas listadas pelo Mercado Bitcoin, inclusive BTC (Bitcoin) e ETH (Ethereum)”, relata o trader. Ainda é possível definir a porcentagem da transação a ser paga com criptomoedas, podendo mesclar criptos e reais.

A Via, antiga Via Varejo, fez aportes na startup byebnk, que atua em gestão de investimentos de criptomoedas. O Coin Cloud também firmou uma parceria com Grupo Carrefour Brasil e está implantando ATM nos hipermercados da rede em que os clientes podem comprar ou vender criptoativos utilizando dinheiro em espécie. O primeiro caixa eletrônico de criptomoedas foi instalado no Jardim Pamplona Shopping, em São Paulo.

Se o varejista quiser implementar esse meio de pagamento em sua operação, Andrade indica utilizar um projeto já existente. “Isso reduz tempo de desenvolvimento e, principalmente, se aproveita da comunidade usuária. Temos, no Brasil, casos com a utilização de Bitcoin, utilizando a estrutura de Lighting Network, Ethereum e Wibx, além de outros ativos. É um processo rápido de adoção depois de escolher a melhor solução”, detalha. 

Vantagens 

De acordo com Srur, essa economia digital oferece uma série de benefícios, entre eles, se destacam a garantia da escassez, a segurança por não ser duplicável, o baixo custo, a rapidez da transação e a irreversibilidade das operações. 

“Aceitar cripto é estar aberto ao mundo, que está cada vez mais digital. O lojista que está inserido nisso está criando uma possibilidade de receita a mais. É muito importante estar atento à inovação e ao que ela pode trazer”, fala o diretor da ABCripto.

Bernardo Srur da ABCripto fala sobre criptomoedas - Revista Shopping Centers
Bernardo Srur, diretor da ABCripto

De forma geral, muitas pessoas têm dúvidas sobre essa nova economia digital, por isso, as empresas do setor buscam sempre oferecer uma educação financeira sobre o assunto, já que existe esse déficit no país. “Esse setor é muito novo para a maioria das pessoas. Precisamos ser claros quando falamos sobre o funcionamento e que ele oferece oportunidades, mas também riscos, como qualquer outro investimento. As principais dúvidas das pessoas são sobre como transformar os criptoativos em dinheiro e questões sobre a segurança das operações”, destaca Andrade. 

Mesmo com o aprendizado em utilizar a tecnologia acelerada pela pandemia, segundo dados do Instituto Locomotiva, 34 milhões de adultos brasileiros ainda não possuem conta em banco ou a utilizam muito pouco. E isso ainda é um dificultador, pois é necessário conhecimento para o uso de tecnologia que envolve blockchain e criptos. O Pix, pagamentos instantâneos, foi um grande divisor de águas na cultura digital do brasileiro, o que ajuda também as criptomoedas porque o sistema de pagamento é muito parecido. 

Há ainda a questão da volatilidade porque os varejistas acabam tendo mais dificuldade de precificar um produto. “Aos poucos, observamos a criação de metodologias para precificar e receber algo em cripto, inclusive, com liquidações automáticas. Ou seja, o cliente paga com cripto e o comerciante recebe automaticamente em reais”, explica Andrade. “A rede Buddha Spa, por exemplo, lançará o próprio token, em que o cliente compra cripto e pode usar em qualquer unidade ou mesmo vender, se não utilizar. Então, é liquidez e isso no comércio é dinheiro. A cripto nasce para tirar os intermediários e aproximar os clientes, trazendo segurança e deixando a operação mais rápida e mais barata”, continua.

Existem ainda dúvidas sobre regulação e o Brasil avançou muito em relação ao tema. “Os debates regulatórios vêm aumentando a cada dia mais, o que traz mais segurança jurídica para o setor operar como um todo e uma perspectiva muito positiva para a adesão ao recebimento de cripto. Por ser um setor novo, com apenas 10 anos no Brasil, a regulação define as regras de responsabilidades, controles e obrigações. O próprio projeto de lei vai evoluindo, conforme esse setor ganha corpo e adesão. A confiança aumenta com as regras sobre governança relacionadas à lavagem de dinheiro e segregação patrimonial,” diz Srur. Mas é claro que há uma série de ações a serem feitas além do Projeto de Lei.

Real digital

A CBCC (Central Bank Digital Currency), em português, moeda digital de banco central, é debatida globalmente e a maioria dos países analisa o quanto elas podem melhorar o mercado de pagamentos de varejo e de promover a competição e a inclusão financeira para a população ainda inadequadamente atendida por serviços bancários. Por isso, o Banco Central vem realizando um estudo sobre a emissão de moeda digital pela instituição e isso pode impulsionar ainda mais o mercado de criptomoedas. 

De acordo com Andrade, é uma iniciativa muito válida do Banco Central porque buscou quem mais entende do setor, que são as empresas. “O real digital pode impulsionar os criptoativos no Brasil porque está sendo desenvolvido por um órgão regulador de mercado e pertencente ao Estado brasileiro e isso tem tudo para dar mais segurança ao investidor. O principal atrativo para o Brasil é a redução do custo de utilização da moeda física e, além disso, ela cria a possibilidade de acesso a novas tecnologias, incluindo os smart contracts, ou dinheiro programável, como se você tivesse um contrato eletrônico que está embutido na sua carteira digital e ele vai sendo executado à medida que se cumprem as condições e cláusulas de contrato. Por último, o smart contract permite que em uma compra de imóvel, por exemplo, só transfira o valor quando a transferência da propriedade for efetivada”, explica.

O Mercado Bitcoin é uma das empresas selecionadas pelo Banco Central para desenvolver DvPs de ativos digitais, com focos em criptoativos, que é uma de liquidação de valores mobiliários, num processo que envolve a entrega simultânea de todos os documentos necessários para efetivar a transferência de valores mobiliários em troca do recebimento do valor estipulado do pagamento.

Segundo Srur, o real digital será a validação que faltava e também ajudará no entendimento da população. “A diferença de uma cripto para o real digital é o Estado que está presente. A cripto tem uma série de atores institucionais envolvidos, os quais administram essa rede descentralizada, fazendo a economia girar em torno dela. Quando se tem essa mesma tecnologia no estado, você tem a emissão e o controle do estado sob essa moeda, mas a tecnologia é a mesma.”

As CBCC vêm sendo estudadas por diversos países do mundo. Srur frisa que é importante destacar que todos os meios de pagamento continuarão existindo e esse será mais um a ser integrado ao sistema financeiro nacional. 

LGPD e impostos

A Lei Geral de Proteção de Dados em relação ao blockchain continua sendo aplicada. É importante dizer que tudo deverá acontecer nos mesmos moldes que a LGPD delimita. Os dados dos clientes, no caso de utilização de um protocolo já desenvolvido, não serão compartilhados com os estabelecimentos. Exceto a wallet de transação e os hashs, que são como os extratos das transações”, relata Andrade. 

Além disso, esses ativos digitais devem ser declarados no imposto de renda, uma exigência da Receita Federal desde 2019 e as regras sobre isenção e tributação podem ser consultadas no site do órgão. Em 2021, os brasileiros declararam R$ 200,6 bilhões em operações com criptomoedas.

Metaverso

A tentativa de criação do metaverso sempre esbarrava no ponto da integração de uma economia entre o mundo físico e o virtual. E isso é superado com a criação da criptomoeda. Várias empresas já estão criando seus tokens não fungíveis, NFTs – cuja sigla vem do inglês non-fungible tokens – , dando a possibilidade de adquirir seus produtos no ambiente que o cliente preferir, virtual ou físico. E isso ajuda o metaverso a se estabilizar porque a cripto é tão importante para esse momento porque ela navega no real e no virtual. “O lojista aceitar cripto dá opção para esse público que está inserido nesse mundo tecnológico. É preciso ter um olhar para o futuro”, finaliza Bernardo.

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