Leona Cavalli: uma atriz intensa e apaixonada pelo que faz
Cada entrega da artista no teatro, na TV ou no cinema é só mais uma prova da qualidade do seu trabalho, que merece admiração e aplausos
As vivências da infância podem apontar o caminho profissional de muitas pessoas. Com Leona Cavalli, 52 anos, foi assim. A gaúcha se apresentou em uma peça na escola aos 6 anos em sua terra natal, Rosário do Sul, no interior do Rio Grande do Sul, e aquele momento foi tão intenso que ela decidiu que seria atriz. “Isso me marcou tanto, que nunca mais quis ser outra coisa na vida”, fala entusiasmada.
Para correr atrás do seu sonho, ainda jovem ela teve que lidar com a distância e a saudade dos familiares. Foi cursar Artes Cênicas em Porto Alegre e, em seguida, desbravou a metrópole pulsante, São Paulo – um desafio para quem saiu de uma cidade, que, hoje, tem menos de 40 mil habitantes.
No entanto, a base que Leona recebeu em casa fez com que viesse despida de preconceitos e pronta para conviver com a diversidade da capital paulista.
“Meus pais, ambos professores de português, sempre me ensinaram muito sobre o respeito e a educação com próximo e também o amor à educação. Como meu pai também é político e advogado atuante em uma linha do partido e a minha mãe é participante de outra, eu sempre convivi com as diferenças. Quando vim para São Paulo, não conhecia ninguém. E ao chegar em lugar desconhecido, é preciso trazer o amor por sua raiz, mas também estar aberta, respeitando a todos, mesmo com divergência de pensamentos.”
Em cena
E assim aberta para entregar sua arte, logo, estreou em Hamlet, sob a direção de José Celso Martinez Corrêa, na reinauguração do Teatro Oficina, em 1993, vivendo a personagem Ofélia. E essa parceria de longa data teve um novo reencontro em agosto de 2022, quando a atriz interpretou Mefistófeles, o próprio diabo, na peça Fausto, uma adaptação de A Trágica História do Doutor Fausto. A curta temporada no Teatro Paulo Autran já deixou saudades.
“A peça trata de temas do bem e do mal e, ao mesmo tempo, de aspectos mais inconscientes da psique humana desse mito do demônio. Ao mesmo tempo, tem humor e uma linguagem mais de farsa. Na adaptação do Zé, há um link com os dias atuais com o Brasil de hoje, com a guerra na Ucrânia, com os movimentos políticos e sociais. Fazer Mefistófeles foi um desafio porque lidei com esse mito.”
A volta ao teatro depois do início da pandemia se deu no ano passado com o espetáculo Procuro o Homem da Minha Vida, Marido Já Tive, que foi um sucesso com duas temporadas em São Paulo e outra no Rio de Janeiro. Por ser uma atriz versátil e apaixonada pelo que faz, Leona consegue se entregar e trabalhar em mais de um projeto ao mesmo tempo.
Muitas vezes, a atriz esteve em cartaz em teatros que ficam localizados em shopping centers como os do Shopping Gávea, Shopping Eldorado e Shopping Norte. “Morando no Rio de Janeiro, São Paulo ou qualquer cidade um pouco maior, o shopping é muito prático.
Eu costumo ir ao que fica mais próximo. É um facilitador porque se tem acesso a tudo o que precisa, ainda com restaurantes e lojas com diferentes necessidades. Eu já me apresentei em teatros de shopping e traz comodidades para o público, porque pode sair para jantar após o espetáculo”, conta.
Leona diz que o palco é a raiz de toda a interpretação e ela sempre que pode volta ao teatro. “Não tem edição. Você está ao vivo e o ator lida com uma sensibilidade que a câmera não capta. Cada apresentação é única. Se assistir as duas sessões na mesma noite, um espetáculo será sempre diferente do outro. Amo essa magia do ‘ao vivo’. Ao mesmo tempo, o palco é onde realmente nos formamos e nos construímos como ator. No meu caso, eu comecei no teatro e depois vieram o cinema e a TV – e eu sempre estou fazendo todos juntos. Cada um tem seu encanto e desafio. Gosto muito de televisão porque chega a um público maior e traz uma linguagem cotidiano que entra na casa das pessoas. O cinema, por outro lado, tem um trabalho de câmera e de luz muito fino e único.”
Em breve, o público poderá assistir A Cerca, estrelado por Leona Cavalli, no papel da protagonista Elisa. O filme de suspense é o primeiro longa metragem de Rogério Gomes, mais conhecido como Papinha. Leona conta que quando começou a pandemia, faltavam poucas diárias para finalização do projeto. “Como Papinha foi fazer a novela Pantanal e eu estava gravando a série O Rei da TV, terminamos o filme em julho. Adorei esse trabalho também porque sou gaúcha e nunca tinha feito uma locação no Sul, nem de cinema nem de teatro na região.”
Em 19 de outubro, O Rei da TV, da Gulane Filmes, estreia na Star+. Com a pandemia, as gravações foram adiadas, mas agora já acumula duas temporadas gravadas e a expectativa para esse trabalho é grande, afinal, conta a história de Silvio Santos e traça o panorama da televisão brasileira. Leona interpreta Íris Abravanel. “Aprendi muito vendo entrevistas e pesquisando dela. Como a série é não biográfica, em nenhum momento, procurei imitar a Iris, é uma livre interpretação. Ela é uma mulher com humor e inteligente e é colocada como uma personagem estrutural na trajetória dele. A série tem uma linguagem mais próxima do cinema, com a direção geral de Marcos Baldini. Acredito que o público irá gostar”, fala.
Durante a pandemia, Leona e o diretor Eduardo Figueiredo também fizeram um trabalho juntos, adaptando a obra Elogio da Loucura, de Erasmo de Roterdã, escrito no século 17. E essa peça entrará em cartaz em novembro desse ano. “É um livro atual, que sempre fui apaixonada. Ele coloca a loucura, falando dela mesma, mas extremamente lúcida. Daí, é possível perceber a loucura do mundo, das relações, das amizades, do casamento, da guerra, da igreja, da política…”
Pacifista
A atriz faz um trabalho voluntário há mais de 10 anos na ONG Paz Sem Fronteiras e o fato de ter contato com a política desde cedo fez com que percebesse que tudo faz parte de um contexto social, mas não no sentido de se engajar com partido político e sim pelo lado humanitário. A ONG Paz Sem Fronteiras ajuda indígenas no Rio de Janeiro (Aldeia Maracanã) e moradores de rua em São Paulo através da doação de cestas básicas e cobertores. “Agora temos o plantio de sementes sem o uso agrotóxicos também. É algo que gosto de participar e acredito ser importante cada um fazer um pouco. A pandemia evidenciou que devemos ajudarmos uns aos outros.”
Apesar de atuar desde a fundação da ONG, a atriz só começou a divulgar esse trabalho voluntário agora. “Não gosto de fazer disso uma propaganda, uma bandeira, mas achei que era momento de falar para que pudesse influenciar outras pessoas. As atitudes pacíficas e humanitárias têm que partir do coração e serem constantes, sem esperar nada em troca”, reforça.
Equilíbrio
A atriz sempre cuidou da sua saúde e, ao mesmo tempo, da alma. Com isso, leva a vida com leveza. Segundo ela, isso tem conexão com sua profissão.
“Amo o que faço e isso está diretamente ligado à minha felicidade. Por outro lado, me cuido, sou vegetariana há muitos anos, gosto de estar ao ar livre e mexer com a terra, adoro plantas e bichos, faço meditação, ioga, um exercício para os chacras… Considero isso importante. Sobretudo, eu aprendo a amar as pessoas. Para representar diferentes personagens, tenho que gostar e aceitar as pessoas como elas são.”
Leona também dirige, produz e escreve. Ela é autora de Caminho da Pedras – Reflexões de uma atriz, que nasceu a partir dos cursos e oficinas que ministra para atores, e de Belabelinha, uma obra infantil. Também dirigiu três peças: Cascando o Bico, O Príncipe e Pandora. O amor de Leona pelas artes é compartilhado com o público de diferentes formas e, com certeza, em breve, ela trará ainda mais novidades e, claro, sempre com os nossos aplausos.