O intenso e admirável Caco Ciocler
O ator conta sobre seus novos desafios profissionais e como a arte e a cultura podem ajudar na construção de um país melhor

Caseiro, mas festeiro; tranquilo, mas baladeiro; noturno, dorminhoco, preguiçoso, mas incansável. Esse é Caco Ciocler, uma pessoa intensa, que não curte muito os momentos de descanso e procura usar seu tempo da melhor maneira possível, mesmo quando não está trabalhando. Gosta muito de ir ao teatro e ao cinema. Para acompanhar os filmes em cartaz, busca sempre as salas mais próximas, de preferência que possa ir a pé. O Espaço Itaú de Cinema, Reserva Cultural e Cine Sesc, na cidade de São Paulo, sempre têm uma programação que o interessa. Como mora na zona Oeste da capital paulista, frequenta mais o Bourbon Shopping São Paulo, porque pode ir caminhando. “Além disso, o shopping possui uma bela livraria, um Espaço Itaú de Cinema, um teatro, alguns restaurantes e lojas que gosto e um bom supermercado”, afirma o ator.
“Enquanto vários teatros e cinemas de rua e companhias de teatro estão fechando, os shoppings têm conseguido seguir o caminho inverso”
Caco ainda reforça a evolução da infraestrutura dos teatros e cinemas nos shoppings que acompanhou ao longo da carreira de 30 anos. “Enquanto vários teatros e cinemas de rua e companhias de teatro estão fechando, os shoppings têm conseguido seguir o caminho inverso”, diz. Para ele, a principal vantagem de estar em cartaz com uma peça em um shopping não é para o elenco, mas para o público. “Infelizmente, as pessoas estão se sentindo pouco seguras, e o shopping oferece essa sensação de praticidade, conforto e segurança, tão caros a quem quer se entreter”. O ator destaca que esses empreendimentos ainda cumprem um trabalho cultural importante, na medida em que possibilitam a exibição das manifestações artísticas ou culturais nesses espaços. “No entanto, esse não é o único ponto a ser levado em conta. É preciso que se faça aqui uma distinção entre entretenimento, produto cultural e arte. Nada contra nenhum deles, os três são importantes, desde que coexistam”, defende.
Para construir um país melhor, Caco aponta a importância da valorização da cultura e dos artistas: “A cultura é o modo pelo qual uma sociedade pode reconhecer-se, e a arte, a maneira pela qual ela pode experimentar um olhar crítico sobre sua própria existência e, assim, desenvolver o desejo para novas possibilidades de existências que vão além das experiências hegemônicas e cotidianas. Sem arte e cultura não existe transformação ou evolução humana”.

“Infelizmente, as pessoas estão se sentindo pouco seguras, e o shopping oferece essa sensação de praticidade, conforto e segurança, tão caros a quem quer se entreter.”
Segundo ele, o governo, o empresariado e mesmo o setor de shopping centers podem impulsionar a cultura com vontade política. “O problema é que o mercado engoliu a cultura. E a lógica do mercado em nada tangencia a lógica da arte. A quem interessa de fato uma sociedade que problematize criticamente suas bases? A quem interessa de fato que o homem investigue seus desejos e suas entranhas? Vivemos no Brasil uma onda de valorização da mediocridade, porque isso é o que de fato interessa à manutenção do controle. O governo federal quer o povo brasileiro de fato pensando? Se quisessem, a arte, a educação e a cultura seriam prioridade, e há tempos seríamos o povo mais evoluído e feliz do mundo!”, conclui.
Em atuação
Estar por trás das câmeras e das coxias sempre faz parte dos nos planos profissionais do ator, e exercer a função de diretor tem ganhado ainda mais força em 2019. Na segunda temporada de Unidade Básica, a série que tem estreia prevista para o segundo semestre, no Universal Channel, o ator será protagonista e também diretor de dois episódios. “Como é a minha primeira direção, ainda fico obcecado pelas ideias conceituais que penso em imprimir. Embora tenha à minha disposição uma equipe, um elenco e uma produção impecáveis, os tempos de realização têm que caber num plano de filmagem bastante apertado para que a série cumpra seu orçamento previsto. Paradoxalmente, me vejo obrigado a lapidar meus objetivos e conceitos e pensar em maneiras de ‘simplificar’ as cenas, para que possam ser feitas em tempo hábil”, conta.
Na sequência, o ator já emenda a direção da primeira peça de Luisa Micheletti, que entra em cartaz agora em abril, no Sesc Ipiranga, em São Paulo (SP). Os dois tiveram um relacionamento de cinco anos, que terminou no ano passado. “Após isso, vou me debruçar na supervisão da montagem de dois episódios da Unidade Básica e também do longa-metragem Partida, que dirigi no ano passado. Em maio, vou estudar em São Francisco, nos Estados Unidos. E aguardo a confirmação de alguns projetos de teatro para o segundo semestre”.
Para conseguir dirigir e atuar, Ciocler marca as cenas com um ator que faz seu papel. Desta forma, pode entender a movimentação e os enquadramentos das câmeras e depois entra para gravar. “A única questão é que posteriormente preciso me assistir, e isso gera uma crise enorme, porque sempre me acho péssimo!”, revela.
Com tantas atuações no teatro, no cinema e na TV, o ator ainda acredita que falte um longa-metragem ficcional em sua carreira e confessa que, às vezes, pensa em adaptar seu livro, Zeide – A Travessia de um Judeu entre Nações e Gerações (Editora Planeta) para essa estreia. A obra narra a história de seu avô, que saiu da Alemanha em 1921 e embarcou para o Brasil. Em terras tupiniquins, ele conheceu a mulher da sua vida e fincou raízes definitivas por aqui. Além de mostrar a trajetória dessa família, a obra é uma homenagem ao avô.
Em cena e em família
O ator sempre busca a oportunidade de fazer uma profunda investigação pessoal da vida sob uma ótica específica a cada novo papel, e busca inspiração nas próprias vivências e no modo em que enxerga o mundo. “Por isso, os artistas, ao mesmo tempo que podem desenvolver um ego gigantesco, são em sua maioria tão propensos às causas sociais e humanitárias e à empatia. Porque seu oficio é justamente o de aprender a olhar para o outro e a olhar para o mundo sob o ponto de visto do outro”, afirma.
Com milhares de seguidores nas mídias digitais, atualmente, o ator se mantém meio distante das redes sociais por falta de tempo e tem gostado disto. “Esse universo de posts e curtidas e comentários e respostas a comentários tem me parecido como uma espécie de ralo energético, que ainda não sei se leva de fato a algum lugar, para um esgoto qualquer ou a lugar nenhum.”
No entanto, no ano passado, suas fotos em família renderam diversos comentários e ele ganhou até o título de vovô gato. O ator é pai de Bruno Ciocler e, há quase um ano, virou avô da linda Elis. Mas o que isso trouxe de mudança para a vida de Caco? “Ver meu filho aprendendo a vivenciar a paternidade ressignificou nossa relação sem que precisássemos trocar uma palavra sobre isso. E sei que para ele também está sendo assim”. O ator voltou a morar sozinho e, quando quer ver o filho Bruno, a nora Marie Juliane e a netinha, precisa viajar 4h30. E, claro, lá recarrega as energias com a família.

*Este texto não representa, necessariamente, a opinião da Abrasce.