
National Federation Retail apresenta os caminhos do varejo mundial
Delegações brasileiras marcam presença mais uma vez e seguem atentas aos movimentos da atualidade

Milhares de executivos visitam a National Federation Retail – Big Show para se aprofundar em temas relevantes do varejo mundial e saem sempre do Jacob K. Javits Convention Center com percepções de que é preciso evoluir. Desta vez, a temática da 115ª edição foi game changer. Entre os assuntos mais comentados entre 12 e 14 de janeiro deste ano, estão a aplicabilidade da Inteligência Artificial e sua força transformadora no varejo. Empresas exploram novas formas de integrar IA generativa para melhorar a experiência do cliente, otimizar a gestão de estoques e até mesmo criar novas formas de atendimento automatizado. A IA também deve ser utilizada para analisar comportamentos de compra em tempo real, permitindo que os varejistas se antecipem às preferências dos consumidores. É importante destacar que muitos outros temas foram discutidos como propósito de marca, atendimento, conexões humanas, gestão de pessoas, sustentabilidade, o consumo das gerações Z e Alpha, entre outros. Enfim, uma verdadeira imersão, fora as visitas técnicas feitas pelas delegações que mostram na prática como o varejo americano inova a cada ano.
A Abrasce sempre apoia três delegações brasileiras e envia, pelo menos, um executivo para que possa acompanhar o maior evento de varejo do mundo. Mais de 2.500 brasileiros estiveram presentes. A NRF continua crescendo: o Congresso superou os 40 mil visitantes com mais de 400 speakers e a feira teve mais de 1 mil expositores.

Por estar em sua 28ª edição consecutiva, Alberto Serrentino, fundador e sócio da BRT-Varese Retail, já pode acompanhar o evento em vários ciclos, momentos do varejo e da economia mundial. Desta vez, foram 280 integrantes CEO e C-Level de varejo, consumo e serviços na delegação.
“Essa edição foi peculiar porque, direta ou indiretamente, quase tudo gravitou em torno de inteligência artificial e como ela transformará radicalmente os negócios. Falou-se muito sobre sua escalada e a oportunidade que isso traz para o varejo. Nunca vi um tema unânime e generalizado em todos os estandes da feira e em todas as palestras, mesmo que as que não eram sobre IA puxaram um gancho dentro do tema abordado. Houve muita discussão sobre cultura, engajamento, o impacto da IA no lado humano e de que forma isso pode contribuir para um crescimento sustentável. Teve ainda contrapontos como a busca por mais experiências, o que abre oportunidades para o varejo”, conta.
Para o FFX Group, foi um ano especial já que levou 229 empresários do varejo brasileiro, que encontraram uma NRF bastante qualificada tanto no conteúdo como nas visitas técnicas e tiveram muitas respostas para as demandas de seu dia a dia. Além disso, segundo Gustavo Schifino, sócio e curador da FFX Experience, a cidade de Nova York se reconstruiu no pós-pandemia e tem sido um laboratório para o varejo brasileiro. “Foi uma NRF muito interessante como se não tinha visto há tempo. Contou com speakers tanto corporativos como consultores que trouxeram excelentes pontos. Euromonitor, GDR e a WDPartners fizeram uma síntese do mundo híbrido que estamos vivendo”, diz Schifino. Dos nove takeaways compilados por eles, o curador da FFX Experience destaca as novas tecnologias e as novas gerações, pois elas drivam o consumo.
“Tem existido, a cada 15 anos, uma mudança geracional e das plataformas de consumo e isso traz uma infinidade de oportunidades e ameaças. A NRF foi rica em apresentar esse universo de ferramentas e alternativas para que o varejo amplie sua proposta de valor. Eu também citaria ainda que as marcas têm vendido seu desespero e não sua proposta de valor e isso foi muito falado. A NRF trouxe a aplicabilidade da IA, mas muitos outros debates interessantes como varejo físico, experiências e humanidade estendida”, conta Schifino, que completou sua 18ª missão no evento.
Juarez Leão, curador da Varejo 180 e CEO do Leão Group, também é mais um veterano com 21 anos acompanhando esse evento. Nesta edição, a delegação também tinha mais de 200 integrantes.

Segundo ele, houve conteúdo com palestras muito boas com destaque para a tecnologia aplicada direita ao varejo, o lado do propósito das operações na prática com cases de empresas que estão fazendo isso de maneira excepcional e a essencialidade da conexão humana.
“A IA estava sempre apoiando outras palestras mesmo que esse não fosse o tema central. Apesar de estar fazendo a revolução nas empresas que estão a utilizando, é preciso do toque humano. Quando se tem a junção de tecnologia e o lado humano é uma ferramenta para conseguir encantar e surpreender o cliente. A IA é uma onda muito mais forte do que a Internet. Seu impacto nas empresas é maior e mais acelerado”, conta Leão.
Gêmeos digitais, análise preditiva por meio da IA com escala e a utilização de IA Generativa no meio operacional também foram destaques dentro deste assunto. “As empresas também estão se esmerando muito para que o cliente tenha o mesmo impacto em sua jornada dentro da omnicanalidade”, diz o curador da Varejo 180.
Segundo Serrentino, várias abordagens sobre IA foram apresentadas como a criação de uma disciplina, priorização e os fundamentos que permitem sua escalada – arquitetura de sistemas, modelos organizacionais, estruturas e processos -, colocando as dores do cliente no centro e desafiando os modelos a tentar aprender com os dados.
“Ela ajuda em processos e na assertividade e impactará nas decisões de sortimento, planejamento, abastecimento, logística, supply chain etc. Ela pode automatizar boa parte das interações e relações com o cliente no pré-venda e pós-venda, assim como muitos processos que, hoje, são manuais, permitindo o salto de produtividade ou mesmo a eficiência das operações das lojas. Ela poderá potencializar tudo o que uma empresa de varejo faz”, relata Serrentino.

“Em resumo, quem está conseguindo conciliar tecnologia e toque humano oferece experiências diferenciadas e autênticas e o que se discute é como encontrar o equilíbrio.
O grande desafio que o varejista tem hoje é conciliar a frieza dos dados e o calor das emoções, pois essas vão fidelizar os clientes”, complementa Juarez.
Com isso acontecendo, o varejo físico vive seu melhor momento, segundo Schifino, então, é preciso aproveitar desde já tudo o que é favorável para seu negócio.
Algumas das palestras
No painel de abertura, John Furner, presidente e CEO do Walmart U.S., e Azita Martin, vice-presidente e gerente geral de Varejo e CPG da NVIDIA, debateram desde exemplos atuais de uso de IA no varejo até a importância de assumir riscos e o aprendizado contínuo. Reforçaram a importância de utilizá-la, destacando o quanto os profissionais precisam se familiarizar e aprender sobre o tema. A NVIDIA, líder em computação de inteligência artificial, recentemente anunciou o seu AI Blueprint para assistentes de compras no varejo, um fluxo de trabalho de IA generativa projetado para transformar as experiências de compras online e nas lojas. Ele ajuda os desenvolvedores a criar assistentes digitais impulsionados por IA que trabalham e apoiam os trabalhadores humanos.

Martin citou como o Walmart também trabalhou com a NVIDIA para focar na previsão de demanda. “Para uma empresa da escala do Walmart, sabemos que até mesmo uma melhoria de 1% na precisão da previsão representa um benefício de negócios significativo.”
Tanto Furner quanto Martin falaram sobre o uso de IA na cadeia de suprimentos. Martin trouxe como exemplo, a Lowe’s, que criou gêmeos digitais nas lojas, atualizando várias vezes ao dia com dados operacionais e de inventário. “Como resultado, isso simula diferentes layouts para ver como os clientes estão comprando neste ambiente, otimizando as vendas.” A empresa investe agora em gêmeos digitais 3D.
Visão da futurista
Em uma das keynote sessions, Kate Ancketill, fundadora da GDR Creative Intelligence, abordou que, embora as ferramentas de IA sejam agora essenciais para o sucesso dos negócios, elas não contam toda a história. Reforçou que é preciso integrá-la nas operações, inclusive, vencendo o medo que as mudanças proporcionam e essa resistência acontece até entre os próprios consumidores. E a melhor maneira de contornar isso está na forma como deve explorar o varejo físico já que ele pode oferecer senso de pertencimento e calor humano, algo que falta na sociedade moderna. Em um mundo cada vez mais digital, essas experiências sensoriais e emocionais proporcionadas pelas lojas físicas são um diferencial que o varejo deve explorar. Ela ainda alertou para três pontos que devem ter a atenção dos varejistas.

O primeiro é a Resistência à IA, já que essa transição não é simples. A grande resistência vem de desafios econômicos e sociais, como o alto custo de supercomputadores e quanto a automação ameaça milhões de empregos. Embora novas funções possam surgir com a IA, essas oportunidades não serão suficientes para compensar as vagas perdidas. Também existem fraudes e a deepfake a serem combatidas frequentemente. O segundo aspecto trazido por Kate é o varejo do escapismo, pois os consumidores estarão em busca de conexões humanas e as empresas podem ser a ponte para isso, criando várias experiências desde lúdicas a multissensoriais. Trouxe ainda dados que apontam que 61% dos consumidores esperam que as marcas os ajudem a sentir emoções mais intensas. Por último, apontou a convergência, caso tudo o que se busca se concretize, podendo ser mais comum avatares interativos das marcas, o uso mais frequente de robôs em atividades mecânicas e operacionais, o que reflete inclusive a carência de mão de obra e o envelhecimento populacional.
Mudanças atuais
David Roth, CEO da The Store WPP, relembrou que os varejistas sempre foram os primeiros a adotar inovações e que a IA é a mais recente delas, mas diferente de tudo. Segundo ele, tem potencial para reescrever o varejo e as relações de lucro e perda, não estando ligada a apenas eficiência ou automação, podendo oferecer uma experiência diferente para os clientes e colaboradores.
“Ela é um multiplicador de força, quando aplicada de maneira absoluta e holística, pode transformar desde a seleção de produtos, merchandising, gestão da cadeia de suprimentos, atendimento ao cliente, devoluções e marketing”, pontuou.
Na Albertson Companies, ela tem revolucionado o treinamento de 275 mil colaboradores da linha de frente, conforme explicou Suzanne Long, chief sustainability and transformation officer da companhia. E isso é incrível já que existe uma taxa de rotatividade anual de 60% a 70% em toda a indústria. Com seu uso, ao invés de usar o tempo de um funcionário para treinar um novo colaborador, a IA faz esse papel. A Lidl, rede de supermercados com 13 mil lojas na Europa e nos EUA, usa a IA para traduzir e resumir materiais de treinamento e manuais de funcionários em diferentes idiomas.
O social commerce
O painel com Dan Frommer, fundador e editor-chefe do The New Consumer, e Katie Welch, Chief Marketing Officer da Rare Beauty, destacaram a relevância do TikTok Shop, que se tornou um grande marketplace e supera as vendas de plataformas como Shein e as tradicionais redes de vendas pela TV.
Metade dos usuários ativos do TikTok já fez uma compra no TikTok Shop e esse canal deve estar ativo no Brasil em breve. Segundo uma pesquisa de Tendências de Consumo de Frommer, 60% dos consumidores da geração Z que conhecem o TikTok dizem que o usam todos os dias. O segmento de beleza é um dos mais beneficiados com esse canal de vendas e, de acordo com Welch, os clientes se mostram leais às marcas. E esse contato se iniciou na pandemia quando os consumidores eram engajados por meio das Rare Chats, as chamadas por Zoom, que passaram depois a serem presenciais . Os fãs da Rare Beauty também são convidados a ir ao escritório e participar de experimentações, outra maneira de construir lealdade.

E existe também a recorrência de compra deste público, mas o produto precisa ser bom. Segundo Welch, esse consumidor também é exigente. Mostrar como o produto funciona é o gancho que impulsiona a venda. A Rare Beauty também desfruta do que Welch chamou de “efeito halo da Sephora”, pois tem uma parceria exclusiva global com a Sephora, que tem uma grande presença no TikTok Shop. Fica a dica de sempre prestar atenção para onde as pessoas estão indo e trabalhar com isso também.
O varejo de alimentos
Desta vez, Michelle Evans, líder global de varejo e insights digitais do consumidor da Euromonitor International, destacou como o gastos com alimentados têm migrado dos supermercados e hipermercados para canais com mais conveniência, incluindo e-commerce, drive-thru e click-and-collect, assim como canais mais focados no valor, como redes de atacado e de descontos. Existe uma mistura em decorrência do comportamento do consumidor. A projeção é que o e-commerce de alimentos cresce 5% em 2025, o setor de serviços deste segmento em 2,7% e 1% para o setor de supermercados na América do Norte. Neste continente, o mercado de alimentos é dominado pela Amazon e Walmart, mas, ao mesmo tempo, para produtos não alimentícios, a Amazon é o principal player, impulsionada pelo Prime e pelos serviços de assinatura. O Walmart aumentou sua participação em itens não alimentícios, com uma alta de 2,64% desde 2022. Quando se trata de itens alimentícios, que possuem uma cadeia de suprimentos mais complexa, o Walmart é o líder, superando a Amazon, aumentando sua participação geral em 5,9% desde 2022.

Esse resultado é em decorrência da Walmart ter vasta rede de lojas como centros de distribuição e entrega, além de locais de retirada de click-and-collect. Além disso, fez investimentos em sua cadeia de suprimentos. Sobre o comportamento do consumidor, Evans trouxe dados interessantes. Existe ainda a questão de preço versus valores. De acordo com a Euromonitor, 30% dos consumidores digitais afirmaram comprar de marcas que alinham-se com seus valores, e 27% disseram boicotar aquelas que não compartilham seus valores sociais ou políticos. Esses dados comprovam que a ideia de encontrar uma pechincha ainda é a principal motivação para as compras, mas está em declínio.
À medida que as compras de alimentos continuam sendo influenciadas pela digitalização — 58% dos consumidores globais afirmaram que pesquisam produtos alimentícios online — e eles têm mais opções de canais, a jornada de compras está se tornando mais complexa. “Isso significa que as empresas precisam ter estratégias de distribuição mais complexas em uma variedade de plataformas”, disse Evans. Por isso, o desafio está em oferecer conveniência aos consumidores e a tecnologia é essencial para isso. Além disso, buscam outras fontes de receita e o retail media tem crescido muito.
Colaboradores e funcionários
Na sessão com Brian Cornell, CEO da Target, Michael Bush, CEO do Great Place To Work e Abubakarr Bangura, vice-presidente do Target Corporation, o debate esteve voltado para as pessoas e quanto é preciso cuidar da equipe. E Bangura é um exemplo de como essa cultura é trabalhada na companhia. Natural de Serra Leoa, ele entrou na Target como estagiário em 2004 e agora supervisiona cerca de 80 lojas em vários estados.

Cornell destacou o quanto o varejo pode mudar vidas e o quanto gosta de ver esse crescimento e desenvolvimento de um membro da equipe. Por outro lado, Bangura destacou o quanto a cultura da companhia está presente em toda a rede. E isso faz com que a sete em cada 10 colaboradores se sintam cuidados como pessoas, não apenas como funcionários. “Isso vem dos líderes,” disse Bush. Cornell ainda destacou a importância de uma cultura ativa.
“Passamos muito tempo com nossas equipes da linha de frente, fazendo perguntas, ouvindo-os, entendendo suas necessidades, como podemos tornar o trabalho mais impactante para eles, como podemos ajudar a desenvolver suas carreiras”, explicou.
A Target tem um programa chamado Prepare for Next, que garante o desenvolvimento da próxima geração de líderes. O objetivo é que eles não estejam apenas preparados para suas funções atuais, mas também para as futuras.
Destaque brasileiro

Alberto Serrentino, sócio-fundador da BTR-Varese, palestrou pela 22ª vez na convenção da NRF apresentou e mediou uma conversa com Paulo Correa, CEO da C&A, e Todd Garner, Chief Product Officer do Sam’s Club. O painel traçou um panorama sobre IA sob as perspectivas do salto da produtividade e da personalização em escala da relação com clientes, mas também sobre o impacto que isso traz tanto no empoderamento como na tomada de decisões e na maneira como as pessoas e as empresas se organizam. Foram dados exemplos práticos do que está sendo feito.
Correa destacou que a C&A tem captado valor com aplicação de IA, melhorando, por exemplo, planejamento, gestão e sortimento. E tudo isso está se revertendo em resultados tangíveis com margens mais altas e melhores resultados. Para a C&A, ela está ajudando com precificação dinâmica, previsão de tendências e até sistemas de pagamento biométrico — mostrando como a tecnologia pode ser profundamente integrada para personalizar a experiência. Todd também destacou como o Walmart assumiu uma nova forma de se apresentar como empresa liderada por pessoas e empoderada por tecnologia para suportar o crescimento. O Sam’s Club, ao usar tecnologia para refinar seu sortimento de produtos e melhorar a experiência dos membros, fica claro que não se trata apenas de automação, mas de aprimorar a qualidade do que é oferecido e tornar tudo mais fácil para os clientes.