JAN/FEV 2025 - Edição 257 Ano 38 - VER EDIÇÃO COMPLETA

Uma pitada da cozinha do renomado chef Claude Troisgros

12 de fevereiro de 2025 | por Solange Bassaneze / Fotos: Divulgação
Entre ingredientes e receitas, ele criou a nova gastronomia brasileira com técnicas francesas

O chef Claude Troisgros está no Brasil desde 1979 e esses longos anos renderam uma grande diversidade de receitas em seus restaurantes, nos programas de televisão e nas redes sociais. Prestigiado desde sua chegada ao país, conquistou não só o paladar dos brasileiros, mas a empatia do público. “Meu contrato era de dois anos e não pensava em ficar a vida toda por aqui. Na época, tinha 24 anos e vinha de uma cidade pequena da França, onde chove 300 dias por ano, e, de repente, me encontrava em Copacabana, com sol, praia e gente feliz e bem-humorada.” Na plenitude da juventude, o chef queria mostrar seu potencial e sua personalidade culinária. “E o Brasil me ofereceu isso com frutas, verduras e especiarias diferenciadas que eu não conhecia, então, comecei a envolver maracujá, goiaba, maxixe, quiabo, aipim, batata baroa… dentro da culinária francesa. Criei uma identidade própria. Isso evoluiu e já se passaram 45 anos. Hoje, essa cozinha está em plena forma. Sem querer, por necessidade, fiz evoluir o sabor brasileiro.”

claude troisgros
Foto: Tomas Rangel 

Claude é a terceira geração da família Troisgros, referência na gastronomia francesa. Seu contato com panelas e ingredientes vem desde a infância, o que trouxe diversos ensinamentos.

“O restaurante da família, em Roanne, perto de Lyon, foi berço do movimento Nova Cozinha Francesa, que valorizou os produtos locais e de pequenos produtores regionais e modernizou a tradição francesa, saindo um pouco do classicismo, fazendo evoluir e criando novas combinações e técnicas. Eu convivo com isso desde pequeno. A marca da cozinha Troisgros é ter um prato que mexe com todos os sentidos: o visual, pois se come com olhos, um prato cheiroso ajuda a saborear, assim como ouvir a crocância da comida e sentir gosto.”

Um prazer para quem gosta de se sentar à mesa e degustar um prato bem elaborado. 

A história da família é incrível.

“Minha mãe é italiana, então, temos esse lado forte nas veias, tanto ela como minha avó nos criaram gastronomicamente falando com essa cozinha de tomate, manjericão e parmesão.  Meus filhos são a quarta geração de cozinheiros. Meus sobrinhos –  filhos do meu irmão Michel – também estão no ramo e tocam a casa da família em Roanne. Temos a quinta geração chegando também, já vejo meus netos interessados nas panelas, em misturar, cozinhar e comer. É muito bonito ver uma família que continua a manter uma tradição culinária, seja no Brasil, na França ou na Itália, é algo raro”, conta o chef. 

No comando

Atualmente, o chef tem restaurantes no Rio de Janeiro (Chez Claude, a cantina do Claude e Mesa do Lado), em São Paulo (Chez Claude, Bar du Quartier e Bistrot du Quartier). Recentemente, inaugurou o Pala 7, no rooftop Palacete Tira-Chapéu, em Salvador (BA). Nas operações da capital paulista e fluminense, consegue ser onipresente, já que ficam no mesmo bloco. “Se estou em um, estou em todos”, diz. Sua rotina é bem agitada, acorda às 8 horas, em seguida, pratica um esporte, depois fica no escritório em casa, onde elabora menus e receitas. No período da tarde, está presente em algum dos restaurantes, onde prepara novos pratos, inclusive, para o Instagram. No jantar, sempre está pronto para receber os clientes. Enfim, demonstra diariamente seu amor pela profissão com muito trabalho.

Para 2025 traz mais uma novidade, desta vez, um novo restaurante no Flamboyant Shopping, em Goiânia (GO). O chef Claude Troisgros já teve outros restaurantes em shopping como o CT Brasserie, no Fashion Mall, que esteve aberto durante 15 anos. “Enxergo que um shopping oferece circulação de gente a semana toda, segurança para o cliente, estacionamento, além de outras atrações como compras, entretenimento e lazer. O meu sócio Marcelo Magalhães é de Goiânia. Quando ele me fez a proposta de ir para Flamboyant, achei ótimo porque é uma região que eu não conheço muito, mas o poder aquisitivo é um dos melhores do Brasil. Fiquei interessado, fomos ver e achei o local extraordinário. Sabemos que é um dos melhores shoppings do país, então, acredito que o Cucina Mia será um sucesso.”

Claude Troisgros costuma frequentar alguns restaurantes em shoppings, especialmente, no Shopping da Gávea, que fica próximo da sua residência, no Shopping Leblon

Em todos os restaurantes, os clientes vivem experiências gastronômicas memoráveis. Para poder proporcionar isso, acredita que vários pontos podem ser explorados, mas ele simplifica o que é fundamental:

“é preciso ter obviamente um ambiente confortável, mas diferenciado e feliz. O Chez Claude, em São Paulo (SP), por exemplo, possui a cozinha aberta e esse contato com o salão gera uma grande felicidade. O segundo ponto é que o serviço deve ser impecável, profissional, mas sem ser chato. Gosto de um serviço familiar em que o cliente se sente em casa. E o mais importante é ter uma gastronomia focada, perfeita tecnicamente, saborosa e inteligente, mas diria que o mais importante de tudo é ter uma personalidade própria e respeitar uma linha de conduta.”

Troisgros conta que nunca tinha pensado entrar para o franchising, mas esse assunto passou a ser uma possibilidade mais recente e surgiu após as aberturas dos dois restaurantes Do Batista, com seu grande amigo e parceiro, o chef Batista,  As duas unidades ficam em shoppings no Rio de Janeiro, no Norte Shopping e no BarraShopping.

“Está indo muito bem e estamos montando agora essa operação de franchising. É uma cozinha brasileira, como o chef Batista é paraibano tem esse lado muito forte, mas vai da feijoada ao picadinho e a carne seca com abóbora. Uma cozinha que a gente ama e é maravilhosa.”

Entre tantos desafios de ter um restaurante, o chef Claude conta que, hoje, o mais complexo tem sido a escassez da mão de obra. “Parece que ninguém mais quer seguir essa profissão, então, temos o desafio realmente de formação profissional em nossos negócios, seja na cozinha, na administração, nas compras… Temos uma profissão difícil que exige o tempo inteiro e o desafio é ainda muito grande.” 

Nas telas 

Claude Troisgros começou a apresentar programas e nunca mais parou. O sucesso é contínuo. Em sua estreia,  já era um chef reconhecido e tinha um restaurante Olympe no Jardim Botânico, no Rio de Janeiro, naquele tempo. “Estou há 20 anos na TV com vários programas, o mais duradouro foi o Menu Confiança, com Renato Machado, e Que Marravilha!, que está no ar há 15 anos.” Atualmente, segue apresentando o The Taste Brasil e o Geladeira em Ação, que começa a ter vida própria na segunda temporada. “Isso abriu portas para que eu pudesse mostrar meu lado de cozinheiro mais popular, onde me aproximo das pessoas ao invadir suas casas através da tela e esse contato com o público é maravilhoso.” Nas ruas, a receptividade é sempre muito carinhosa. “Como sou uma pessoa pública ligada à comida e à arte de cozinhar, as pessoas me reconhecem como um cozinheiro que mostra suas receitas mais familiares e caseiras. E isso é muito lindo. Quando me param na rua, temos até troca de receita, falamos de comida, de restaurante, de sabor, de mistura, de tempero… É muito bom.”

O chef fez uma ponte entre a gastronomia francesa e a brasileira de um jeito muito peculiar.

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O chef Claude Troisgros no Programa Geladeira em Ação 

“A cozinha moderna brasileira que eu comecei nos anos 1980, hoje em dia, segue está em plena forma, graças a competência, a criatividade de chefs – a formação que fizeram internacionalmente – e, principalmente, do produtor que conseguiu evoluir com a gente.” Hoje, existe acesso a produtos que não conseguiam naquela época. “Por exemplo, o pequi era só conhecido regionalmente em Goiânia e, hoje, o temos na época certa em nossa mesa como um produto totalmente diferenciado. Como conheço o Brasil bem, já que viajo para entender essa cultura gastronômica, posso dizer que é uma das melhores do mundo. Cada região tem suas particularidades e seus sabores bem destacados.”

Quando retorna à França, também busca conferir as novidades de restaurantes que ainda não conhece para entender a linha de conduta do momento, mas volta sempre aos seus bistrôs favoritos.

“Gosto do francês tradicional. Eu sinto muita saudade deste estilo de comida, então, faço questão de frequentar esses bistrôs animados e felizes.”

Essa profissão sempre é influenciada por outros chefs de outros países e com Claude Troisgros não é diferente. Para ele, os chefs mais marcantes são os do início da profissão, pois acompanham o profissional tecnicamente por toda a vida. “Um dos meus grandes mentores foi o chef, líder francês e mundial, Paul Bocuse, que me ensinou a respeitar a tradição e modernizá-la de maneira inteligente e sutil.” Se recorda ainda muito dos ensinamentos passados pelo chef austríaco Heinz Winkler, que liderava o Tantris, com três estrelas Michelan.

“Trabalhei por lá durante um ano e meio. Só para ter ideia, o cardápio mudava no almoço e jantar todos os dias. Um chef muito criativo, a gente entrava sem sair o que iria preparar para o almoço ou jantar em cozinha com 24 a 28 pratos. Aprendi muito e aprendi que a cozinha não pode ficar presa. O chef deve estar aberto às suas ideias, obviamente, com suas técnicas. Isso faz uma cozinha moderna.”

Ao longo de sua carreira, o chef compartilha também seu conhecimento e segue pronto para colocar em prática novas ideias. “Eu tenho muitos projetos, alguns acontecendo, outros no papel e outros na minha cabeça, mas não vou dar spoiler”, diz. Então, aguardem que sempre tem surpresa. Agora, se essa leitura, que não é um menu e assim mesmo deu vontade de preparar um delicioso prato hoje, ele deixa uma dica culinária que serve para todos os dias: “Cozinhe sempre respeitando o produto, trate-o de uma maneira simples e saiba temperar.” E lembre-se: a gastronomia depende do momento. 

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