Overview do Seminário de Marketing e Insights
Executivas da NoPonto Marcas, Talk Inc e TikTok apontam tendências globais com aplicabilidade no varejo e nos shoppings
Uma das salas de cinema do Bourbon Shopping São Paulo foi o ponto de encontro dos participantes do primeiro Seminário de Marketing e Insights, organizado pela Abrasce, que contou ainda com transmissão online, ampliando o alcance para os interessados de diversas partes do país. A manhã foi marcada por três palestras — todas conduzidas por mulheres potentes, experientes e profundamente conectadas às transformações do mercado. Entre provocações, dados e casos práticos, elas compartilharam repertório, vivências e tendências que vêm moldando o futuro da comunicação e do varejo. Foram horas ricas, produtivas e leves, que ajudaram a expandir o olhar dos profissionais de marketing do setor.

Durante o evento, Gabriella Oliveira, diretora de Planejamento Estratégico e Operações da associação, lançou oficialmente a campanha para 2026 que marca os 50 anos da Abrasce e os 60 anos do setor, um ciclo considerado emblemático pela associação. Ela destacou que a equipe vem trabalhando desde o início do ano de 2025 na atualização da marca — agora acompanhada por um novo selo que reflete as evoluções do mercado e do comportamento do consumidor — e apresentou a proposta de transformar a celebração não apenas numa campanha publicitária, mas em um ato coletivo que mobilize ativos de todo o país. “Quanto mais shoppings aderirem a esse movimento, mais bacana certamente será o resultado.”

Estudo de Tendências e Oportunidades Internacional
Na aguardada palestra de Cris Duarte, fundadora da NoPonto Marcas, o assunto foi esse report feito em parceria com a Abrasce, que contém mais de 200 páginas e está disponível na área do associado no site da associação. É um material riquíssimo para ser explorado pelos times de todos os shoppings, muito bem fundamentado. Em suas falas iniciais, ela reforçou o quanto é uma curiosa profissional e sempre com disposição de olhar e vivenciar experiências como se fosse a primeira vez. “Sou sempre uma página em branco.” E é com esse espírito que ela visita grandes festivais e eventos de SXSW à NRF, sempre, claro, a partir de uma curadoria criteriosa. Uma edição da NRF reúne 175 sessões, o SXSW ultrapassa 1.700 painéis, e o Web Summit são mais de 900 palestrantes — volume impossível de absorver sem filtro. “Curadoria é vida”, diz.
E a partir deste olhar para o mundo, a NoPonto Marcas elaborou o Estudo de Tendências e Oportunidades Internacional, identificando quatro macrotemas: Saúde, Tecnologia, Valorização do Humano e Marketing e Comunicação – que se destacam como forças motrizes de transformação. Dentro de cada um deles, subtemas sinalizam novas demandas, oportunidades de inovação e caminhos estratégicos para marcas, negócios e a sociedade. Ou seja, é um grande quebra-cabeça de curadoria, construído a partir de conteúdos dos principais eventos globais, com um pouco mais de foco em NRF, SXSW, Web Summit, mas há muitos outros papers e conteúdo complementar.
O estudo traz números e pesquisas para fundamentar decisões, apresenta cases de diferentes setores como inspiração, aponta oportunidades práticas e oferece recomendações. É um material para ser explorado pelos times dos shoppings, independentemente do porte do ativo.
“Podem usar 5%, 10% ou 150%, porque está na mão de vocês como querem aproveitar esse material”,recomenda a fundadora da NoPonto Marcas.

Saúde social
Em Saúde, Cris escolheu abordar o subtema Saúde Social, destacando que não é apenas estar com outras pessoas, mas sobre criar vínculos significativos e sentir pertencimento, pois isso fortalece as pessoas emocionalmente, aumenta a motivação e impacta a longevidade e a qualidade de vida. E trouxe um dado impactante: um em cada quatro adultos se sente sozinho. Cris comentou sobre o fenômeno do individualismo tóxico: jovens e adultos isolam-se e buscam dopamina em estímulos artificiais. “Vivemos a pandemia da solidão e deveríamos exercitar nosso músculo social.” O estudo de Harvard de 1938, o mais longo já realizado, acompanhou mais de 700 homens e hoje inclui mais de 2 mil pessoas. A principal conclusão: relações sociais de qualidade são essenciais. Pessoas bem conectadas vivem mais, com benefícios para corpo, coração e cérebro, enquanto a solidão prejudica a saúde.
E as marcas já perceberam isso e criaram campanhas incríveis que estimulam o relacionamento. Em sua explanação, apresentou a ação The Friendly Twist da Coca-Cola, em que jovens só conseguiam abrir o refrigerante em dupla na escola, e a Milka, que criou uma máquina que dependia da interação coletiva para liberar chocolates. Ao olhar o sorriso das pessoas, é possível ver o impacto real dessas ações. “Em termos de oportunidade é sair de uma marca mais transacional e criar uma marca mais relacional.”
Para ela, o desafio é transformar o individual em coletivo, criando experiências intencionais que promovam conexão. “Temos que sair de um lugar de passagem para um lugar de pertencimento”, pontua, enfatizando a importância de envolver múltiplas gerações e olhar para a comunidade ao redor. O objetivo é claro: relações fortes aumentam felicidade, saúde e engajamento, mostrando que investir em vínculos humanos é também estratégico para marcas e organizações.
Tecnologia autônoma
Em seguida, Cris abordou o subtema tecnologia autônoma, definindo-o como fio condutor de todas essas transformações. “Ela não substitui relações, mas amplifica a relação.” Ou seja, oferece ferramentas e perspectivas que permitem criar experiências mais próximas, personalizadas e significativas. A palestrante destacou os avanços, desde robôs domésticos até veículos autônomos, mostrando como a automação pode se integrar à vida cotidiana.
Ela também trouxe exemplos de robôs com apelo relacional, como o Neo, projetado para ambientes domésticos, simpático e acolhedor, e o Optimus, voltado para uso industrial. Cris apontou que a tecnologia já se mostra capaz de apoiar questões de saúde mental, depressão e solidão, permitindo interações seguras e empáticas. “Daqui a pouco vamos nos deparar com robôs andando na rua, e a gente precisa estar preparado”, alerta.
O relatório ainda traz casos de gamificação e geolocalização, que transformam espaços físicos em ambientes de engajamento personalizado. Com apps e tecnologias sensoriais, marcas podem oferecer experiências que conectam pessoas de forma individual, mas dentro de um contexto coletivo. Segundo ela, a oportunidade está em usar a tecnologia de maneira cordial e relacional, em vez de apenas comercial como se dá atualmente. “O desafio é não deixar isso frio. A tecnologia está disponível e é preciso olhar para isso com cuidado e carinho, e criar vínculos reais.”
A busca pela analógico
Neste assunto de Valorização do Humano, Cris trouxe como atividades analógicas– como crochê, cerâmica ou um cafezinho compartilhado – funcionam como contraponto à estafa tecnológica. Ela comentou: “A gente está querendo o básico. Um papo, um café, um abraço, uma conversa”. E esses hobbies terapêuticos ganham força em economias criativas e contribuem para o engajamento e a conexão pessoal, alinhando-se com a agenda da ONU para o crescimento sustentável.
A palestrante apresentou exemplos internacionais inspiradores, como o The Offline Club, que organiza retiros para reconectar pessoas consigo mesmas por meio de leitura, pintura e outras atividades criativas; e, hoje, já está em 10 países em 16 cidades, tendo realizado mais de 500 eventos. Cris mostrou ainda outras experiências presenciais e coletivas que resgatam vínculos genuínos. “Em termos de oportunidade então, estamos falando dessa re-humanização do consumo. Saindo de novo do relacional, gerando uma proximidade.”
No fechamento, ressaltou que há oportunidades práticas para marcas e organizações neste sentido, incentivando a criação de experiências personalizadas e mão na massa. A chamada é por espaços de respiro e pela cocriação com clientes. Afinal, as atividades analógicas engajam, humanizam e promovem o bem-estar coletivo.
Creator Economy
Foi a escolhida dentro do macrotema Marketing e Comunicação. E segundo Cris, não existem respostas prontas, porque tudo está acontecendo em tempo real. Então, é preciso adotar uma postura mais exploratória.
Ao apresentar cases recentes, apontou como grandes marcas já internalizaram o papel estratégico dos criadores de conteúdo. O Airbnb, por exemplo, profissionalizou a relação com criadores ao incorporá-los à estratégia e estruturar programas próprios de afiliados. Já a Wherby, marca de óculos que nasceu pequena, fortaleceu sua presença com microinfluenciadores. Para ela, o segredo é simples: “O jogo muda quando você é pertencente”, explica, reforçando que propósito, comunidade e autenticidade são os motores desse novo ecossistema.
Cris também destacou as oportunidades para os shoppings dentro desse cenário, defendendo que eles podem se transformar em palco vivo de criação, tanto para creators quanto para o próprio público. consumidores também criam conteúdo e que as marcas precisam enxergá-los como cocriadores. “Como é que a gente trabalha para que eles ajudem a gente a contar, criar, montar o que está acontecendo nos nossos lugares?”. Para ela, o caminho está na aproximação real: trazer criadores para a mesa, promover encontros recorrentes, apoiar produções e criar espaços pensados para essa nova dinâmica digital.
A criatividade como ferramenta de conexão com o novo consumidor
O segundo painel foi com Marina Landherr, head de criatividade do TikTok na América Latina, que mostrou que o marketing já não pode operar pela lógica vertical que marcou décadas anteriores. No modelo tradicional, explicou, “as marcas e agências tinham esse poder muito grande de definir o que eles queriam comunicar”, distribuindo mensagens prontas que chegavam à comunidade de forma unilateral. Isso mudou radicalmente. “O conteúdo é criado não somente por marcas e agências, mas principalmente por uma comunidade pulsante.”
Essa transformação tem implicações diretas para o posicionamento das marcas, que já não conseguem mais inaugurar narrativas do zero. “Eu sempre falo: não tem mais conversa para ser iniciada. As conversas já estão sendo discutidas.” Em vez de tentar impor temas, Marina defende que marcas precisam aprender a entrar em diálogos que já estão acontecendo — entendendo códigos, ritmos, humores e necessidades reais da comunidade. Foi essa lógica que tornou possível o maior fenômeno de consumo deste ano: o Morango do Amor, que viralizou sem qualquer estímulo publicitário. “Neste caso, as pessoas queriam provar e falar sobre ele”, relembra. E isso transformou não só as redes, mas o varejo e o agronegócio, já que a fruta teve alta no preço.

Para ela, esse caso é o símbolo de uma nova era em que a cultura se move de baixo para cima e as tendências surgem de forma inesperada e orgânica. Degustações espontâneas, receitas caseiras, piadas e até desastres culinários viraram parte da construção coletiva. “Vira uma explosão e as pessoas podem brincar com essas trends de qualquer jeito”, disse. O assunto teve mais de 2 bilhões de visualizações entre julho e agosto de 2025 no TikTok.
Trouxe ainda exemplos como creators, longe de grandes estruturas de mídia, podem transformar mercados inteiros — e como isso redefine o papel das marcas. E esses rostos comuns com vidas reais geram identificação. E isso, segundo Marina, é o que sustenta a Creator Economy. “Essa pessoa é como eu. Então, eu aceito esse conselho”, resume. É quase boca a boca levado ao mundo digital.
Apresentou ainda dados em que 74% da geração Z utiliza o TikTok como ferramenta de busca para diversos assuntos. Além disso, três em cada quatro usuários afirmam confiar mais em criadores que mostram seu cotidiano, e mais de 60% já compraram algo por influência direta de um vídeo genuíno. E defendeu que o papel das marcas é entender que esses criadores não produzem apenas conteúdo — produzem pertencimento. Por isso, são essenciais para conectar empresas às comunidades.
A mudança é tão profunda que até gigantes como a Nike já trocam narrativas heroicas por vozes verdadeiras. “As marcas que conseguem criar conexões emocionais autênticas são as que conquistam atenção, lealdade e um vínculo duradouro. A pessoa a dedicar atenção para sua marca é um asset maravilhoso.” Ela mostrou ainda um vídeo da CPTM, que mesmo enfrentando críticas cotidianas em sua operação, conquistou milhões de visualizações com vídeos divertidos e próximos da comunidade. “É um órgão público construindo empatia.” Hoje, ninguém quer ser ignorado. “O maior inimigo hoje da conversão não é o dislike. É a indiferença.”
Enalteceu ainda que cada shopping é uma marca — e que precisa saber o que sua comunidade quer descobrir, não apenas o que deseja comunicar, criando conteúdos que resolvam dúvidas reais, ofereçam utilidade concreta, celebrem a vida cotidiana das pessoas e transformem visitantes em comunidade ativa.
Transformando o olhar do marketing em insights sobre o comportamento dos frequentadores
A apresentação de Cristina Brand e Carla Mayumi, fundadoras e sócias da Talk Inc., abriu com a grande novidade: em parceria com a Abrasce, elas conduzirão uma pesquisa nacional com 3.300 entrevistas para mapear hábitos, expectativas e comportamentos dos frequentadores de shopping em 2026. Como explicou Cristina, a ideia é “entender o que está mudando de verdade na vida das pessoas” e transformar isso em insumos estratégicos para o setor.
“Há quase 20 anos, a Talk Inc ajuda as empresas a entender comportamentos e decodifica, transformando em insights, em dados, em tendências, em inovação para trazer inspiração para que as marcas trabalhem de uma forma contemporânea, adequada ao momento com a linguagem correta e navegando neste mundo em transição, entendendo o que está acontecendo”, conta. Tem como clientes grandes empresas como Itaú, Google, Meta, Lojas Renner, Heineken e Uber. O objetivo é sempre transformar gestos, hábitos e microdecisões em insights práticos.

Já Carla trouxe a visão internacional que complementa todo trabalho, lembrando que passou a última década investigando ecossistemas de inovação em lugares como China, Coreia do Sul e Japão. Segundo ela, olhar para fora é essencial.
Apresentaram ainda os dados da pesquisa IA na Vida Real, conduzida pela Talk Inc. em 2024. Os resultados impressionam: “Nove em cada dez brasileiros já usam IA”, conta Carla, explicando que o uso se tornou incorporado na rotina, mesmo quando as pessoas nem chamam essas ferramentas de inteligência artificial. O retrato reúne hábitos reais observados nos grupos focais — desde quem monta cardápios com ajuda até quem compara eletrodomésticos, interpreta exames médicos, prepara viagens, planeja rotina e decide compras.

Esse comportamento se conecta diretamente ao consumo. A busca por produtos foi totalmente redesenhada: antes as pessoas navegavam por dez abas de navegador; agora começam no Google, no YouTube ou diretamente em um modelo de IA. “ 2025 foi o boom do ChatGPT. Ele influencia na decisão da marca de geladeira que o consumidor irá escolher”, enaltece Carla. A consequência é um consumidor mais informado, mais exigente e muito mais estratégico.
Nesse contexto, elas mostraram como o varejo físico precisa se reposicionar. A loja continua importante, mas agora como espaço de confiança, curadoria e acolhimento. O valor do shopping está justamente no que a internet não consegue oferecer: encontros, presença e comunidade.
Vários exemplos reforçam essa força da vida presencial, como, por exemplo, as sessões de cinema para tricô na Coreia. “As pessoas querem se encontrar, querem pertencimento. A gente subestima isso”, ressalta Carla. Esses microeventos precisam entrar no calendário e com um olhar para a comunidade. A China apareceu como referência fundamental, tanto nas soluções de conveniência — como cabines individuais para reuniões dentro de shoppings — quanto no reposicionamento do varejo online para o físico: “A JD, maior loja do e-commerce chinês, lançou uma loja física porque precisam construir um diferencial de marca”, explica Carla. Por isso, é preciso olhar para o mercado asiático e entender o que eles estão fazendo, pois é o país que mais coleta dados a partir de uma população de 1,4 bilhão de habitantes.” Por isso, fazer cruzamento físico-digital é o maior campo de oportunidades dos próximos anos.




